enchentes_rioA triste saga do mês de janeiro, principalmente para os habitantes do Rio de Janeiro, se repete. Apesar dos discursos inflamados, promessas de campanha e a sistemática repetição dos deslizamentos nas encostas das cidades litorâneas do Brasil, nenhuma providência é tomada, durante o ano, para evitá-la.

Isso vale tanto para o estado do Rio de Janeiro, onde até terça (18) já se contavam mais de 700 mortes por causa dos deslizamentos e inundações, quanto para S. Paulo, Minas Gerais e outros estados afetados pelas cheias.

A população já cansou de promessas. Por menos que isso, muita gente interdita ruas, invade prédios, cerca palácios, faz greve nacional, operação padrão. Não se viu isso no Rio ou em S. Paulo, ainda.

Atordoada pelo impacto negativo da tragédia, a população continua acreditando que as promessas dos governos federal, estaduais e municipais irão realmente se efetivar. Mas quase sempre são iludidas. Quantas vidas poderiam ser salvas na tragédia do Rio, se a Defesa Civil do estado tivesse dado o alerta de chuva forte, com vendavais? Não adiantaria? Diriam alguns. Especialistas são categóricos em afirmar que as tragédias poderiam ser evitadas, com preservação das margens dos rios e a proibição de construções em encostas, principalmente após a destruição da mata, como vem acontecendo nas regiões atingidas. Ou se houvesse um sistema avançado de alerta, como foi usado agora nas enchentes da Austrália, com várias cidades completamente inundadas e apenas 16 mortes. Após tantos anos de calamidades semelhantes, só não é possível evitá-las ou pelo menos minimizá-las num país onde as prioridades são outras.

Mas não adianta agora a imprensa fazer uma ampla cobertura, mostrando imagens da presidente da República, do governador do Rio e outras autoridades com semblantes compungidos, como se apenas a natureza, e não eles, fossem também culpados por tudo isso. Quanto de verba desviada para obras inúteis, shows badalativos, queima de fogos, campanhas eleitorais, patrocínios políticos e fartas campanhas publicitárias destinadas a promover governos e pessoas em época de eleição? Se apenas parte desses recursos fosse aplicada em saneamento básico, contenção de encostas, assoreamento dos rios, remoção de famílias pobres para locais mais seguros e preservação do ecossistema, certamente o número de mortes não seria tão grande.

As tragédias, sejam as de ordem climática, como essa do Rio do Janeiro ou até mesmo as de S. Paulo e Minas Gerais, quanto outras como desabamentos, incêndios, acidentes, epidemias ou falhas na segurança da população em sua quase totalidade são causados por negligência, erro ou má administração. Elas provêm da falta de manutenção, de inexistência de sistemas preventivos, da autossuficiência de que nada “comigo” vai acontecer.

No caso específico do Rio de Janeiro, quantas promessas não ouvimos no ano passado quando da tragédia de Angra dos Reis e do Morro do Bumba? Até há poucos dias as famílias dessas tragédias se queixavam de que não tinham ainda recebido as indenizações prometidas. Como pode-se acreditar que as autoridades destinaram recursos, como prometido, para as obras previstas, que poderiam evitar pelo menos em parte a repetição das cenas que assistimos no ano passado?

A culpa nessas horas, como acontece em São Paulo, a cada alagamento da cidade, é da natureza, que jogou mais água sobre as ruas do que o previsto. Mas isso não acontece em outros países, mesmo em grandes aglomerados urbanos como São Paulo, onde os recursos são bem aplicados nas obras de escoamento e contenção. Aqui, nossas autoridades sempre são tomadas de surpresa. As prioridades são sempre outras.

Passado agora o trauma e a triste contagem dos mortos, podemos ter certeza de que não faltará verba para o carnaval. Afinal, festa sempre é uma ocasião para governantes aparecerem sorrindo, simulando uma alegria que as inúmeras famílias que continuam nas encostas e em áreas de risco não podem compartilhar. Porque vivem com medo. Traumatizadas. Se não saem, na quase totalidade é porque não têm para onde ir. Cabe ao governo buscar alternativas. A garantia de segurança e da preservação da vida é uma obrigação do estado para com a populaçao. Não há outra forma de evitar que certas regiões do Brasil deixem de ser cenário de morte e destruição a cada janeiro.

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