Arruda_mais_fotoA prisão do Governador do DF, José Roberto Arruda, é o desfecho de uma crise que começou no fim do ano passado e durante dois meses foi marcada por trapalhadas e ações que lembram uma operação tabajara.

Quando estourou, analisamos neste Blog os muitos erros do GDF  na condução da crise e comparamos o governo do DF a um boeing atingido em pleno ar, com várias vítimas, sem a empresa aérea ter qualquer plano de emergência. O governador se perdeu desde os primeiros dias, tentando assumir o papel de vítima de um ex-secretário que já tinha um passado pouco recomendável. Mesmo respondendo a vários processos na Justiça, foi mantido no governo para trabalhar em área extremamente sensível e vulnerável.  Se o governador foi chantageado alguma vez, por supostos esquemas de arrecadação de campanha, deveria ter denunciado. Se é inocente, deveria provar com fatos e contraprovas.  Ele não conseguiu fazer isso.

Ou seja, após mais de dois meses de desgaste, a prisão é apenas o desfecho natural para uma crise que nunca teve uma linha coerente de explicação. Afirmar e reafirmar inocência não basta quando a crise é grave.  O discurso precisa sempre ser sustentado por fatos.  

Uma crise também pode ser o momento definitivo de uma vida profissional. Em nenhum momento, Arruda, advogados e porta-vozes foram convincentes em passar para a opinião pública a isenção do governo no episódio. Sempre ficou uma nódoa de desconfiança, a começar pela frágil e ridícula versão dos panetones, que virou piada nacional. Os vídeos dos parlamentares, divulgados à profusão, serviram para completar a comédia pastelão em que se transformou a administração do DF e todos os seus tentáculos, com cueca, meias e bolsas cheias de dinheiro.

As tentativas de desconstruir o discurso e as versões do ex-secretário, pivô das denúncias, foram apenas boas peças de retórica, mas soaram falsas e sem consistência. Até porque o denunciante, por privar da intimidade de todos os envolvidos e por usar métodos escusos de escuta clandestina, conhece todos os pontos vulneráveis dos acusados. A sabedoria popular muitas vezes é mais perspicaz para definir em poucas palavras o que se passava no GDF: ali ninguém é inocente.  Não dá para acreditar em ninguém. É uma afirmação dura, mas de certo modo resume a forma como a opinião pública do DF definia a crise de Arruda e seu governo.

Para completar a impressão de que essa crise, por mal explicada, encaminhava-se para uma intervenção da Justiça, a atuação de parlamentares na Câmara Legislativa ajudou a afundar ainda mais o governador. A opinião pública de Brasília e o Poder Judiciário  não sentiram em nenhum momento disposição da maioria dos parlamentares para apurar com seriedade o que aconteceu no DF nos últimos anos. Jogaram apostando na maioria da base aliada e tentaram abafar a CPI.  Por trás das artimanhas para embaralhar o jogo político da Câmara Legislativa, sempre aparecia a sombra do governador. Não se manteve isento como a situação recomendava. Esse foi outro erro na tentativa de debelar a crise.

Denúncias também chegaram de que os manifestantes, que saíam às ruas para defender o governador, eram pagos com dinheiro público. Até arapongas de Goiás foram presos nas proximidades da Câmara Legislativa, com suspeita de tentarem grampear parlamentares da oposição. Todos figurantes que parecem ter saído da série Todo mundo em pânico. Sem saber para onde correr, faziam tudo errado.

Os atores coadjuvantes que cercaram a crise também são curiosos. A mais recente trapalhada envolveu pessoas ligadas ao governo do DF, entre eles um jornalista, que já privou da intimidade do poder local, além de um deputado amigo do governador, o secretário de comunicação do DF e um funcionário público com livre acesso à residência oficial, sem falar no sobrinho e secretário particular.

Ficou difícil não ver o dedo do governador nas múltiplas versões que circularam nos últimos dias ou na tentativa de suborno ao jornalista Edson Sombra. Não existe a mínima credibilidade em qualquer das pessoas envolvidas no episódio, tanto de um lado, quanto de outro. São figuras patéticas, em que a lealdade é medida pelo volume de reais que está em jogo. A operação, por simplória e ostensiva, chega a beirar o ridículo.

Cercado por pessoas que, para debelar a crise, tentaram usar os mesmos artifícios utilizados para dilapidar o patrimônio público, a defesa do governador acabou se confundindo cada vez mais. O uso de gravações e propinas, com ofertas de dinheiro milionárias, com artifícios muito semelhantes ao do ex-secretário que denunciou o esquema de corrupção, só agravaram a situação de Arruda e de seus auxiliares mais próximos.

Quando se analisa esse episódio sob o aspecto da gestão de crise,  princípios básicos foram atropelados, a exemplo do que se comentou na matéria anterior. Nesses momentos, deve-se centrar a atuação nas mensagens-chave que se quer passar para o público, para tentar consolidar uma versão consistente, aquela que o público deveria entender como resposta oficial sobre a crise. Saber o que dizer, quando dizer. E escolher quem vai dizer. O GDF nunca teve uma versão oficial. Não sabia o que dizer. E, quando falava, não tinha credibilidade.

Não custa perguntar.  Alguém conseguiu assimilar uma versão coerente, convincente e verossímil que explicasse as denúncias contra o GDF? Alguém ficou sabendo quem era o porta-voz oficial dessa crise? Ou falava o governador, ou falavam os advogados. Quando não, a assessoria de imprensa. Só podia dar no que deu.

A afirmação do ministro Fernando Gonçalves, do STJ, parece resumir o que de mais duro poderia ser dito para um governo que procurou sempre falar em ética e transparência: “Esse esquema de corrupção está instalado no centro do poder da capital da República”. Para o ministro, um grupo criminoso exerce o poder no governo do DF e, em razão do que classificou de “conduta audaciosa”, “não resta outra alternativa senão a prisão”.

Quer dizer, a Justiça reconhece que existe um esquema de corrupção, entendeu que o governador sabia e participava dele, por isso a decretação da prisão, e que ele estaria dificultando a completa apuração dos fatos. Um epílogo inusitado e vergonhoso para a política nacional, que a bomba ambulante chamada Durval Barbosa e os métodos pouco republicanos do governador Arruda e seus assessores ajudaram a escrever.

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