O crescimento das matrículas universitárias, associado ao avanço da tecnologia, acentuou uma prática antiga, mas que agora tomou uma dimensão preocupante. O plágio em trabalhos acadêmicos surfa nas ondas da internet e seduz jovens pouco afeitos à prática da pesquisa e adeptos da preguiça intelectual.
Professores universitários flagram ensaios, artigos, monografias e dissertações com reprodução parcial ou total de artigos disponíveis em sites de buscas da internet ou de textos já publicados em livros e revistas. Os trabalhos omitem os verdadeiros autores, constituindo-se apropriação indevida da propriedade intelectual.
Mas a onda não contamina só os universitários. Em outubro, o vice-diretor da Fundação Universitária para o Vestibular (Fuvest), professor Nelson Carlin, pediu demissão do cargo por responder à denúncia por fraude intelectual. Ele recebeu uma moção de censura da Reitoria da USP. Em 2007, o professor Mahir Hussein acusou Carlin de ter copiado partes de seus textos em artigo publicado no volume 75 da revista Physical Review C. Além da acusação de cópia, a contagem de palavras indicou que menos de 23% do artigo publicado era original. Após meses investigando a denúncia, a apuração foi encerrada com o pedido de demissão de Carlin, quando a Reitoria da USP reconheceu o plágio e aplicou a moção de censura.
A denúncia apurada na USP surgiu em abril do ano passado. Os artigos foram publicados em revistas do exterior. A acusação de plágio em artigos científicos abriu uma crise entre os professores da entidade, com repercussões na imprensa, até porque a USP foi pouco transparente, no início do processo, e desencadeou um debate na mídia sobre essa prática.
O problema não se restringe ao Brasil. Só no ano passado, o Office of Research Integrity (ORI) dos Estados Unidos, especializado em analisar pesquisas médicas, recebeu 217 denúncias de plágio, abriu 14 investigações, encerrou 28 inquéritos - dos quais 10 registraram má conduta em pesquisa - e puniu sete pesquisadores com medidas que incluem suspensão de financiamento e cassação de registro.
Não existem dados oficiais no Brasil sobre plágio, porque não temos um organismo fiscalizador. A supervisão de publicações de pesquisa no Brasil, portanto, não é rigorosa. Nesse universo ilegal, proliferam na internet sites que impunemente oferecem e negociam a produção de trabalhos acadêmicos, o que configura crime. Mais grave, entretanto, é admitir a existência de uma clientela fiel para esse tipo de oferta.
Professores e pesquisadores admitem que a pressão do mercado por cursos de graduação e pós-graduação, junto com as exigências profissionais no trabalho, induzem alguns universitários a optar pelo caminho mais fácil na hora da pesquisa: recorrer à enciclopédia Google. Clonar artigos da internet é apenas uma das modalidades. Capítulos de livros ou artigos acadêmicos encontrados nas bibliotecas também são plagiados. A fraude exige uma atenção redobrada dos professores e membros de bancas examinadoras, que precisam acompanhar passo a passo a evolução dos trabalhos, para não engolir sapo por lebre.
O papel dos professores
O que fazer para coibir essa prática abominável, que fere a ética profissional, e estimular a produção intelectual honesta, compromissada e original, principalmente nos jovens?
Professores ouvidos pelo Comunicação & Crise argumentam que, desde o início dos cursos, tanto de graduação, quanto de pós-graduação, todo o professor deveria deixar bem clara sua posição sobre pesquisa. De um lado, estimular a leitura, a descoberta, o desafio da ciência de buscar novos caminhos que recompensam aqueles que, no dizer do filósofo Charles S. Pierce, são “pessoas que querem descobrir”.
De outro, não admitir qualquer tipo de referência, sem a citação completa da fonte. Nos casos comprovados de plágio, deixar claro para o aluno e os colegas que o fato sempre será considerado falta grave. Os futuros profissionais precisam desde cedo entender que plágio é crime e, como tal, não pode ser aceito pela academia e pela sociedade. Pode parecer um deslize menor, mas não é.
Para o professor Fernando Martins, docente universitário em S. José do Rio Preto, um dos fatores que contribuem para o plágio é o sistema educacional brasileiro de base não preparar o aluno para a realização de pesquisas. Os trabalhos são muitas vezes cópias de livros ou sites. Segundo ele, o professor também tem culpa, quando, assoberbado, aceita qualquer tipo de trabalho entregue pelo aluno. O professor do Centro Universitário de Brasília, Paulo Paniago, doutor em Comunicação, defende a expulsão do aluno flagrado em plágio. “É o pior crime profissional que um jornalista comete. O mundo acadêmico está se vendo às voltas com a fraude intelectual e a quantidade parece avassaladora”.
O economista e pesquisador Guilherme Nobre, doutor em Comunicação pela USP, diz que “não importa o tipo ou grau do plagiador: a sociedade deveria gastar mais energia para premiar o criativo-inventivo do que para punir o copiador-plagiador. Com relação a estes últimos, se não me agrada o que fazem, não estou convencido se merecem toda a atenção que se lhes dá. Um nota zero, uma repreensão pública, talvez uma demissão bastaria. Porque, na academia, isso pega muito mal, e uma acusação de plágio (falsa ou verdadeira) pode corresponder já a um eterno ostracismo”.
Para o professor Carlos José da Silva, da Fundação Universa, de Brasília, “o plágio revela, ao mesmo tempo, a derrocada do nosso sistema educacional e familiar, além da experiência de vivermos no novo mundo virtual em que ninguém sabe direito como as coisas vão evoluir. Temos aí um choque de gerações, também”. A professora e doutora em comunicação, Heloiza Matos, afirma que a internet, ao mesmo tempo que democratiza a informação, o que é louvável, também tem suas desvantagens. “O aluno se sente poderoso por ter acesso à informação. Mas é importante saber o que procurar, avaliar a autoridade da fonte e, principalmente, articular as informações obtidas com o tema proposto. Muita informação disponível não garante o conhecimento”.
Relatório do ORI mostra que nos EUA a ênfase é em medidas preventivas que começam na graduação. Durante um ano - dos 18 em que trabalhou na Universidade de Notre Dame -, o antropólogo Roberto Da Matta – citado em matéria de Carla Rodrigues sobre plágio, no jornal Valor Econômico - presidiu o Comitê de Honra da faculdade, que chegou a ser acionado numa denúncia de plágio. “Lá, como em qualquer universidade nos EUA, o aluno assina um termo de compromisso quando se matricula. Se flagrado em qualquer prática fraudulenta, vai a julgamento no comitê interno e pode ser expulso”.
O que aprendi em Harvard é que sempre devemos citar nossos mentores, nossos financiadores e as instituições que nos acolheram, diz Da Matta. Ele lamenta que a prática da citação esteja quase em desuso: "Em um sistema acadêmico consistente, citar deve ser um prazer e um orgulho."
Por aqui, o perigo é o plágio se tornar algo trivial, até mesmo tolerado como um deslize apenas, entre universitários. Mesmo trabalhos simples, como resenhas ou ensaios, que exigem mínimo esforço intelectual, acabam reproduzindo artigos da internet ou partes de livros, sem citar a fonte.
Isso tem acontecido nos cursos de graduação e pós-graduação. Os professores acabam prejudicados e afrontados. Quando desconfiam da originalidade do trabalho – tarefa muito fácil para um profissional experiente –, eles gastam tempo precioso em pesquisas na internet ou bibliotecas para comprovar a pirataria intelectual. Suprema ironia: a mesma tecnologia que facilita o acesso a artigos plagiados, acaba se virando contra o fraudador, porque é o instrumento mais fácil de descobrir o plágio.
O lamentável é que orientadores apressados e sem compromisso com o trabalho intelectual, fingem desconhecer o plágio. Na pressa para cumprir prazos, aceitam, com certa complacência, trabalhos que não correspondem à capacidade intelectual do aluno. Acabam sendo cúmplices de uma fraude por meio de um pacto de mediocridade. O objetivo é desvencilhar-se da tarefa, aprovar o aluno, não interessando a qualidade ou originalidade do trabalho.
Estamos aprovando doutores com trabalhos que há dez anos não seriam aceitos como monografias de graduação, diz o professor Marcelo Hermes de Lima, do Instituto de Biologia da UnB.
As escolas de ensino superior deveriam deixar bem claro no regimento dos cursos a configuração do plágio como crime, sujeito a penalidades pesadas. Aluno descoberto com plágio deveria ser reprovado e, em casos mais graves, jubilado, expulso do curso.
A socióloga Maria Teresa Citeli, também citada pelo jornal Valor Econômico, Professora do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) já encontrou plágios até em trabalhos de alunos de graduação, como os que discutem o clássico Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Hollanda. São textos falando de moralidade, mas eles nem percebem que também estão fazendo algo imoral. Ela adotou como regra reprovar quem copia e quem fornece material para a cópia.
Recorrer ao plágio, atribuindo-se a autoria de um trabalho de terceiros, sem dar o devido crédito ao autor, além de crime e violação da lei dos direitos autorais, mostra uma tentativa de enganar o professor, a universidade e a sociedade. Será que esse aluno, quando chegar à vida profissional, irá utilizar artifícios contábeis, sonegação, fraudes financeiras ou produtos maquiados para atingir seus objetivos? O plágio é pirataria intelectual. Uma vida acadêmica baseada em pesquisas fraudulentas é a ante-sala de uma carreira profissional também calcada em pressupostos falsos.
O caso da USP é apenas a ponta do iceberg. Na área médica, existem constantes denúncias de artigos, publicados no exterior, que não são originais. Em junho último, um dos mais conhecidos psiquiatras ingleses, apresentador de programa de TV e autor de livros, o Dr. Raj Persaud, 45, reconheceu suas ações como inapropriadas e enganosas ao confessar ter usado trabalhos de outras pessoas em livros e artigos. Ele admitiu ter plagiado quatro artigos para seu livro de 2003, From the edge of the couch. Ele também admitiu a reprodução de outro material como se fosse seu em artigos para jornais e revistas, incluindo o matutino The Independent, de Londres.
O exemplo vem de cima
O que existe no mercado acadêmico é uma pressão das escolas de ensino superior para a produção intelectual, o que induziria os professores a utilizarem expedientes pouco ortodoxos na publicação de seus trabalhos. Por isso, o plágio tem várias roupagens.
Prática altamente questionável é o chamado autoplágio. O intelectual reedita, com pequenas alterações, artigos de sua autoria já publicados, requenta o trabalho, para publicação em várias revistas, como se fosse nova produção intelectual. Na verdade, trata-se de uma colagem de parágrafos.
Mas existem outras artimanhas. Professores e pesquisadores exigem a inserção do próprio nome em trabalhos de alunos, a fim de melhorar sua exposição em publicações. É o chamado “clube de co-autoria”, muito comum nas ciências exatas. O trabalho original não é dele. A co-autoria acaba funcionando com instrumento de multiplicação do número de artigos que cada autor publica.
Da mesma forma, pesquisadores estimulam a produção de trabalhos acadêmicos assinados por várias pessoas. O texto publicado acaba engordando o curriculum de todos os envolvidos. Alguns artigos são assinados por mais de 20 pessoas. Revistas internacionais está recusando trabalhos assinados por muitos autores.
Na internet já começam a aparecer sites especializados em detectar a pirataria intelectual. O site Deja vu - A study of scientific publication ethics é mantido pelo Centro Médico da Universidade do Texas. Estão catalogados 144 mil artigos da área médica em que alguma duplicação de citação é identificada, apontando para o primeiro indício de autoplágio. Outro site voltado para a discussão de fraudes de artigos ou matérias jornalísticas é plagiarism.org. Esse endereço se propõe a ajudar educadores e estudantes a desenvolver um entendimento melhor do que o plágio significa na era da informação, estimulando habilidades para produzir textos e pesquisas com qualidade.
De tudo o que se falou sobre plágio, faltou o ingrediente que anda escasso no admirável mundo novo da tecnologia e válido para profissionais de todas as áreas, principalmente educadores, jornalistas e alunos. A palavrinha mágica é ética. A academia e as redações não precisariam se preocupar com plágio, se os profissionais cumprissem o código de ética. Pouco adianta incluir ética como disciplina dos curriculum acadêmicos, se os intelectuais e universitários são os primeiros a rasgá-la quando se escondem atrás de textos de outros autores. Não estivesse esse valor tão escasso, e a internet poderia se transformar realmente no grande salto de quem tem o privilégio de viver na era da informação: excelente fonte de auxílio para facilitar e melhorar a pesquisa no mundo acadêmico.
O que é plágio
Muitas pessoas pensam que plagiar é copiar o trabalho de outro, ou apossar-se das idéias originais de outro. Porém, termos como “copiar” e “pegar emprestado” podem descaracterizar a gravidade da ofensa:
De acordo com o Merriam-Webster Online Dictionary, “plagiar” significa
1. Roubar e repassar (as idéias ou palavras de outro) como suas.
2. Usar (a produção de outro) sem creditar a fonte
3. Cometer roubo literário
4. Apresentar como nova e original uma idéia ou produto derivada de uma fonte existente.
Mas palavras e idéias podem ser roubadas?
De acordo com a legislação dos EUA, a resposta é sim. A expressão de idéias originais é considerada propriedade intelectual, e é protegida por leis de direitos autorais, do mesmo modo que as invenções originais. Quase todas as formas de expressão estão sob proteção dos direitos autorais, desde que estejam registradas de alguma maneira (como um livro ou um arquivo de computador).
Todas as ações seguintes são consideradas plágio:
- apresentar o trabalho de outra pessoa como seu;
- copiar as palavras ou idéias de alguém sem dar crédito;
- deixar de colocar uma citação entre aspas;
- dar informação incorreta sobre a fonte de uma citação
- mudar as palavras, porém copiar a estrutura da sentença (frase) sem dar crédito;
- copiar tantas palavras ou idéias de uma fonte que se torne a maior parte de seu trabalho, dando crédito ou não.
A maioria dos casos de plágio pode ser evitada, contudo, pela citação das fontes. Simplesmente reconhecer que certo material foi pego emprestado, e prover os leitores com as informações necessárias para localizar aquela fonte, é geralmente o bastante para prevenir o plágio.
Fonte: http://www.plagiarism.org/ - Acessado em 10/11/2008
Publicado com autorização do site.
Tradução: João Paulo Forni
What is Plagiarism
Many people think of plagiarism as copying another's work, or borrowing someone else's original ideas. But terms like copying and orrowing can disguise the seriousness of the offense:
According to the Merriam-Webster Online Dictionary, to plagiarize means
1. to steal and pass off (the ideas or words of another) as one's own
2. to use (another's production) without crediting the source
3. to commit literary theft
4. to present as new and original an idea or product derived from an existing source.
In other words, plagiarism is an act of fraud. It involves both stealing someone else's work and lying about it afterward.
But can words and ideas really be stolen?
According to U.S. law, the answer is yes. The expression of original ideas is considered intellectual property, and is protected by copyright laws, just like original inventions. Almost all forms of expression fall under copyright protection as long as they are recorded in some way (such as a book or a computer file).
All of the following are considered plagiarism:
• turning in someone else's work as your own
• copying words or ideas from someone else without giving credit
• failing to put a quotation in quotation marks
• giving incorrect information about the source of a quotation
• changing words but copying the sentence structure of a source without giving credit
• copying so many words or ideas from a source that it makes up the majority of your work, whether you give credit or not (see our section on fair use rules).
Most cases of plagiarism can be avoided, however, by citing sources. Simply acknowledging that certain material has been borrowed, and providing your audience with the information necessary to find that source, is usually enough to prevent plagiarism. See our section on citation for more information on how to cite sources properly.