A receita publicitária, que garante os custos bastante elevados dos jornais, está em queda. Os anunciantes fogem por causa da crise econômica, porque migram para outras mídias ou porque deixam de anunciar. A audiência continua alta, os leitores querem os jornais e relutam em migrar para a internet, mas os jornais não conseguem manter estruturas muito onerosas para segurar o padrão de qualidade.
As eventuais quedas na tiragem não seriam grande problema, porque esse parece ser um fenômeno mundial. Incluindo o Brasil. Os jovens relutam em adquirir assinaturas ou comprar em bancas jornais impressos. Porque pertencem à geração internet e não têm paciência para ler os grandes tijolões.
Pesquisa da Research International, encomendada pela Folha de S. Paulo, com pessoas de mais de 15 anos das classes A e B da Grande São Paulo, mostra os meios que essa mostra utiliza com mais frequência para se informar. 37% apontaram a internet, 34% a TV aberta, 12% TV por assinatura, 8% rádios e somente 8% jornais. As revistas ficaram com 1%. A internet, portanto, superou a televisão.
O empresário Rupert Murdoch, o todo poderoso dono da News Corporation, dona de vários jornais nos EUA, Inglaterra e Austrália, entre eles o The Wall Street Journal e a rede de TV Fox, já anunciou que vai cobrar pelo conteúdo de internet a partir do próximo ano. Ele aponta a liberação de conteúdos nos sites dos jornais como uma das causas da crise do NYT, por exemplo. Quem iria assinar o jornal, se tem o conteúdo de graça na web?
Recente pesquisa da Audit Bureau of Circulations, dos EUA, mostra que somente os jornais USA Today (+69,2%) , The Wall Street Journal (+6,6%) e New York Post (+25,4%) aumentaram a circulação. Os demais grandes jornais, como NYT (-11,3%), Los Angeles Times (-36,3%), Daily News (-43,8%), The Washington Post (-22,3%) e Chicago Tribune (-29,3%) tiveram queda. Jornais centenários, como o Rocky, de Denver, fecharam a edição impressa.
A crise atinge também a imprensa européia. O The Times, de Londres, teve que circular durante a semana em formato tablóide, uma heresia para os britânicos, para economizar papel. Somente domingo circula a edição no tamanho padrão a que o inglês está acostumado. Na França, Sarkozy socorreu os meios de comunicação com um pacote de bondades que chegou a 600 milhões de euros. O El País, na Espanha também enfrenta problemas com a crise econômica e o início de uma recessão no país, mas é um dos poucos grandes jornais a ter aumentado a tiragem.
Alguns jornais europeus descobriram em alternativas na internet uma maneira de compensar a queda da receita das edições impressas. Na Noruega, o site vinculado ao tablóide Verdens Gang, de Oslo, conseguiu uma margem de lucro de 30% com a venda de conteúdo on line no site VG Net. O grupo alemão proprietário do Bild, o maior jornal da Europa, anunciou o maior lucro do seus 62 anos. Ou seja, eles encontraram alternativas ao assédio da internet sobre o público mais jovem.
Ainda existe espaço para o jornal impresso?
O professor Paul Starr, da Universidade de Princeton(EUA) e ganhador do Prêmio Pulitzer de não ficção de 1984, consultor da Casa Branca, em 1993, e fundador de duas revistas sobre a evolução do liberalismo, diz que “as pesquisas em ciências sociais mostram que, onde a mídia noticiosa é fraca, a corrupção está muito mais presente”. Para ele, sem uma imprensa independente capaz de cobrar responsabilidades dos governos locais e estaduais, o projeto básico de uma democracia federal fica comprometido. Ele abriu um debate com jornalistas sobre o tema, preocupado com a queda de circulação e a crise econômica dos jornais.
Ele admite que os jornais tiveram importante papel na consolidação da democracia americana. O desaparecimento deles pode ser uma perigosa ameaça. A internet está enfraquecendo a capacidade da imprensa de subsidiar a produção de jornalismo de serviço público, e isso por uma razão, sobretudo. “Os jornais diários já não ocupam a posição de intermediários entre compradores e vendedores que ocupavam no passado”. Ele assegura que os veículos on line não preenchem a brecha deixada pelo recuo dos jornais.
Starr não vê como a web poderia ser capaz de sustentar o tipo de jornalismo para o público geral que os jornais têm produzido, historicamente. Reconhece o avanço da web mas não vê na internet, pelo menos a curto prazo, um espaço para apoiar o jornalismo independente.
Steven Johnson, editor chefe e co-fundador da Feed Magazine, autor de livros e coordenador do site Outside.in, debateu com Paulo Starr o futuro dos jornais e tem outra visão. Para ele, “existem boas razões para pensar que o sistema de notícias on line será melhor que o modelo dos jornais com o qual convivemos nos últimos cem anos”.
“O novo mundo é mais diversificado e interligado. É um sistema no qual as informações fluem com mais liberdade. Essa complexidade o torna interessante, mas dificulta as previsões de como será sua aparência em cinco ou dez anos.”
Ele acredita que o grande saldo da web, provando que ela pode superar os jornais, foi dado na eleição americana de Barack Obama. As análises feitas em sites e blogs traziam relatos aprofundados sobre a corrida presidencial, algo que o NYT jamais teria “tinta suficiente para cobrir”.
As análises das pesquisas instantâneas, na web, superavam, segundo ele, qualquer coisa oferecida pela CNN. Oito milhões de pessoas acompanharam pelo You Tube o discurso de Obama sobre a questão racial. Ele pergunta se as grandes redes de TV teriam transmitido ao vivo esse discurso. Com certeza, não. Quando muito o noticiário noturno daria um minuto para o discurso.
Ele também não é tão radical, a ponto de marcar a data para os jornais desaparecerem, como fez Philip Meyer, no livro “Os jornais podem desaparecer?”. “Não é que os jornais irão desaparecer – é apenas que deixarão de ser a espécie dominante”.
*A íntegra dos debates de Paul Starr e Steven Johnson foi publicada na Revista britânica Prospect, no artigo Are you on track for a golden age of serious journalism? e reproduzida no Brasil no Caderno “Mais”, da Folha de S.Paulo, de 10 de maio de 2009.