WTC foto boaO atentado ao World Trade Center (WTC), em Nova York, completa 15 anos neste 11 de setembro. Foi o maior ataque sofrido pelos Estados Unidos em solo pátrio, superando em número de vítimas o célebre bombardeio japonês a Pearl Harbour, que matou 2.403 americanos, em 1941, estopim para a entrada dos EUA na II Guerra Mundial. No WTC houve 2.996 vítimas fatais e mais de 6 mil feridos. Passados 15 anos, muitas perguntas sobre o atentado continuam sem respostas, principalmente as que buscam entender como os EUA, tão preparado para ataques externos desde a Guerra Fria, permitiu que 19 terroristas se apossassem de quatro aviões e cometessem os atentados, sem qualquer tipo de reação.

Os Estados Unidos tinham no radar a informação de que um grande atentado poderia ocorrer no país ou fora dele, em 2001. Vários incidentes precederam o ataque de 2001, incluindo um atentado a bomba ao próprio World Trade Center, em 1993. Após esse, houve atentado às Embaixadas americanas no Quênia e na Tanzânia, em 1998; e o atentado suicida ao destroyer USS Cole, da Marinha dos EUA, quando ele estava reabastecendo no porto de Áden, no Yemen, em 2000, todos com mortos e feridos. A CIA, diz o jornal USA Today, tinha monitorado alguns dos suicidas de 11 de setembro, nos Estados Unidos, como potencial ameaça, mas as autoridades nunca levaram a sério a informação.

Em 2011, publicamos um artigo “O atentado de 11/09 sob a ótica da gestão de crises”, baseado em um documentário "State of Emergency", divulgado na época pela CBC News, canal de TV americano. As perguntas que se faziam, então, o histórico das falhas, os heróis e a análise da desarticulação da defesa americana continuam válidos. Até porque a ameaça continua, principalmente na Europa, na Ásia e na América do Norte. O terrorismo definitivamente entrou para a agenda de defesa das grandes potências. Se nas décadas de 1950 a 1970 a Guerra Fria era a grande ameaça ao mundo, numa disputa pela hegemonia global entre Estados Unidos e a então União Soviética, a partir da década de 1990, com a dissolução do império soviético, o terrorismo passou a ser o maior perigo a assombar as potências mundiais. Vale a pena recordar o que houve em 2011 e como essa crise foi gerenciada.

O atentado de 11/09 sob a ótica da gestão de crises

Dez anos depois do maior atentado terrorista da história, que derrubou as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York, convém analisar a tragédia sob uma outra ótica. Como os americanos conduziram essa tragédia, sob os preceitos da gestão de crises?

Um país sempre preparado para a guerra, para o confronto, aparelhado desde os tempos da Guerra Fria para reagir a qualquer ataque dos inimigos do Oriente. Assim eram os Estados Unidos até 11 de setembro de 2001.

O que aconteceu à grande potência bélica mundial, a mais poderosa máquina de guerra do planeta? Surpreendido por um grupo de fanáticos, ficou horas à mercê de ataques, sem saber de onde partiam. O Presidente Bush, tão surpreso quanto qualquer cidadão americano, de certo modo acuado na Flórida, teve que decolar e manter-se no ar, no Force One, para evitar um possível ataque terrorista em solo. Esse “gap” nos mecanismos de defesa americanos permitiu que apenas 16 fanáticos religiosos produzissem o maior atentado terrorista da história e o maior ataque aos Estados Unidos, em tempos de paz.

Vamos analisar, agora, o atentado de 11 de setembro, sob o enfoque da gestão de crises.

O planejamento

O atentado de 11 de setembro, que matou cerca de 3 mil pessoas, começou a ser planejado em 1993, depois de uma explosão no próprio World Trade Center. A ação fracassada da década de 90 deveria destruir as torres gêmeas e deixar mais de 250 mil mortos, mas vitimou apenas seis pessoas. Esse fracasso empurrou o grupo extremista para o planejamento de um atentado mais violento e o alvo passou a ser as torres gêmeas, segundo depoimento de prisioneiros da base aérea de Guantánamo.

“O plano de ataque de 11 de Setembro foi apresentado a Khaled Sheikh Mohamed (KSM) por Ramzi, que já havia tentado explodir as torres, e seu amigo Abdul Murad. A intenção era transformar aviões em mísseis para destruir os dois prédios”. A informação é do escritor Ivan Sant'Anna, autor do livro “Plano de Ataque”.

O relatório oficial do Congresso norte-americano sobre o atentado, “The 9/11 Commission Report” diz que foi apenas em 1999 que KSM se filiou formalmente à al-Qaeda e Osama bin Laden deu sinal verde para a Operação Aviões. Começaria então a escolha dos pilotos e demais suicidas que participariam da missão que tinha tudo para dar errado.

Segundo Sant"Anna, “O 11 de Setembro contou muito com o fator sorte. Inicialmente Osama Bin Laden queria que participassem da missão apenas nascidos em Meca, mas seria inviável conseguir homens dispostos, e que tivessem conhecimento suficiente para pilotar as aeronaves. Aí entra a sorte. Quatro homens de nível universitário, que moravam em Hamburgo, na Alemanha e, portanto, dominavam o inglês, foram recrutados para lutar na Chechênia e acabaram integrando a Operação Aviões”.

Toda essa fase de planejamento não foi detectada pelo serviço secreto americano. Mas o pior ainda estaria por vir. Os principais líderes da operação, que depois comandariam os aviões, entraram nos Estados Unidos livremente e se matricularam em escolas de pilotagem na Flórida. Ninguém desconfiou, ninguém monitorou. Até hoje não foi bem explicado, porque a CIA, no governo Bush, teria recebido alertas de que terroristas haviam entrado no país, e não levou a sério esses avisos. Ou seja, era possível, com um eficiente sistema de inteligência, ter prevenido e certamente evitado um possível atentado terrorista, em 2001.

Sucessão de erros

O ousado ataque, utilizando aviões como mísseis, pegou de surpresa toda a defesa americana. A exemplo da Noruega, também surpreendida por um fanático, no mês passado, as defesas americanas estavam voltadas para o exterior. E não para enfrentar um ataque dentro do país. O mais criativo diretor de Hollywood jamais bolou um enredo tão ousado que simulasse a destruição das torres gêmeas.

Naturalmente, segundo o escritor Ivan Sant'Anna, o dia de céu aberto e limpo, naquela terça-feira, 11 de setembro de 2001, também seria determinante para o “sucesso” dos ataques. Com tempo nublado, talvez os pilotos inexperientes não conseguissem atingir seus alvos. Pilotos experientes asseguram que não é tarefa fácil pilotar um Boeing entre uma avenida de arranha-céus, como na Ilha de Manhattan, e acertar o alvo, como aconteceu com pelo menos dois grupos de terroristas, exatamente os que atingiram o World Trade Center.

A força aérea americana também foi colhida de surpresa. O treinamento dos pilotos era para neutralizar sequestradores que pousam aviões e exigem resgate. Não para ataques suicidas. Por que esse cenário nunca foi contemplado nas simulações de crises das forças de defesa americanas? Uma falha grave, portanto.

Nesses momentos de crises graves, em que os dirigentes são surpreendidos e ficam batendo cabeça, aparecem mentes lúcidas, executivos ousados que acabam tomando as decisões mais importantes. É o caso de Ben Shiney, chefe do controle aéreo dos Estados Unidos, no dia 11 de setembro. Era o primeiro dia de trabalho do novo controlador-chefe, que pode ser colocado hoje na galeria dos heróis nacionais daquela tragédia.

Ele recebe um comunicado de outra heroína, a aeromoça Betty Ong, comissária que avisa a American Airlines de que o voo 11 tinha sido sequestrado: “Ninguém atende o telefone na cabine do piloto. Alguém foi esfaqueado na classe executiva e estamos com dificuldade para respirar aqui na executiva, eu acho que usaram spray de pimenta, ou algo. Não conseguimos respirar, mas eu acho que estamos sendo sequestrados”, diz a comissária para o controle da sua empresa.

Ao receber a informação do FBI, repassada por Betty Ong, Ben Shiney, sem consultar qualquer autoridade, até porque o presidente Bush estava incomunicável, tomou a ousada e corajosa decisão de interromper todo o tráfego aéreo do país.

“Havia 4 mil aviões no ar. Tinha uma ameaça, mas os Estados Unidos não sabiam o tamanho da ameaça”. Ele então ordenou que todos os aviões no ar aterrisassem e nenhum aparelho em terra poderia decolar. A intenção era só deixar no ar os aviões dos terroristas. Foi a primeira iniciativa lúcida daquela manhã.

Na Flórida, o Presidente Bush foi avisado pelo seu staff do tamanho da encrenca, quando estava numa escola pública, escutando a leitura de crianças. O olhar estupefacto de Bush, no momento em que recebe o aviso, flagrado por um canal de televisão, é daquelas cenas históricas antológicas, que entram para o tragicômico anedotário mundial. É um olhar de espanto e insegurança, ao mesmo tempo.

Depois dos primeiros momentos de estupor, o Presidente recebeu a orientação de decolar imediatamente. Antes, porém, seu staff preparou um “News Statement”. Bush lê rapidamente para a imprensa o Comunicado, sem aceitar perguntas. Era o máximo que o presidente poderia dizer àquela altura, porque nem ele, nem seu estado maior tinham uma dimensão exata do que estava acontecendo no país. Nesse momento em que Bush estava falando, um dos quatro aviões sequestrados ainda voava sem ser monitorado pelos radares, o United 93.

Bush queria voltar para Washington, para comandar a defesa. Mas Condoleezza Rice disse ao Presidente: “Você não pode voltar para Washington”. Logo após, um presidente acuado decola sem destino. A operação evasiva do Force One era para evitar um ataque em terra. A maior potência do mundo se curvava à ameaça de um punhado de terroristas.

No World Trade Center reinava o caos, com os dois prédios em chamas. Pessoas corriam para todos os lados, sem saber de fato o que estava acontecendo. Entendiam agora que os Estados Unidos estavam sob ataque. Em Nova York, o chefe dos bombeiros, mesmo avaliando os riscos da operação, tomou outra decisão certa: entrar no prédio. “Um prédio queimando é um prédio em demolição”, disse o comandante. Mas a obrigação dos soldados do fogo era tentar salvar o maior número de pessoas no incêndio. Essa operação ousada custaria a vida de 373 bombeiros, sepultados quando as duas torres caíram.

Mas nas torres de controle dos aeroportos americanos, ainda sem saberem a extensão dos ataques e quantos aviões haviam sido tomados, fazia-se a seguinte pergunta: onde estão nossos soldados? Dois caças F16 recebem ordem para partir para Washington, para defender a capital. Como ocorreu isso? Ao ouvir a mensagem de um terrorista, que por engano havia apertado o botão errado, o controlador de voo Peter Zalewski reporta o sequestro do avião para o Setor de Defesa Aérea Noroeste (Neads). O órgão mobiliza jatos da Força Aérea  para localizar e seguir o avião da American Airlines. Isso ocorreu às 8h37. Mas os pilotos foram treinados para se defender do inimigo que vem pelo mar. E nessa direção eles voam. Ou seja, seguem os procedimentos da Guerra Fria, em que o inimigo vem de outros continentes.

Os caças estavam prontos para se defender de um ataque aéreo russo e não de terroristas. É surpreendente, mas 22 anos após a queda do muro de Berlim, seguida do fim do comunismo, os radares das defesas americanas ainda estavam mirando ataques da União Soviética e seus satélites. Enquanto isso, o terceiro avião, o American Airlines 77, voa em direção a Washington, sob o desespero das torres de controle, que não o detectavam porque o transponder (aparelho que permite detectar um avião no ar) estava desligado pelos terroristas.

Falha no sistema de defesa

A ordem para os caças voltarem veio do Comando de Controle do Tráfego Aéreo: “Voltem já e voem com toda velocidade para a Casa Branca”. O alvo do voo 77 no entanto, é o quartel general da defesa americana, o Pentágono, onde trabalham 23 mil pessoas. Não se sabe por que, o avião erra o alvo. O objetivo, provavelmente, era atingir em cheio o prédio. Ele mergulha antes e destrói uma parte do prédio, matando 184 pessoas.

Ao destruir parte do Pentágono, os terroristas expuseram uma grave falha de defesa do comando militar americano. O quartel general de defesa dos Estados Unidos era um alvo fácil, assim? Atordoados pelo ataque, os comandantes militares não sabem o que fazer. Segundo o documentário “Estado de emergência”, produzido pela BBC de Londres, sobre os dez anos do 11 de setembro, “anônimos assumem a defesa”. Mesmo com a ordem do comandante militar de ninguém entrar no prédio, parcialmente destruído pelo fogo, alguns heróis arriscam a vida e voltam ao edifício para salvar os colegas sobreviventes.

Em Washington, com o governo em crise e praticamente sem comando, Condoleezza Rice resolve levar as autoridades para o abrigo antibombas, um bunker construído para a eventualidade de um ataque nuclear, a 30 metros de profundidade. “Não achávamos que o bunker fosse seguro naquela hora”, disse a ex-Secretária de Estado. A pergunta é, como organizar uma reação se não se sabe onde está o inimigo e qual o seu potencial? Nem a Força Aérea sabe quem defender e quem atacar.

Nesses momentos de crise e conturbação, em que a maioria das autoridades está atônita ou em pânico, proliferam os boatos. Rumores de novos sequestros inundam as comunicações e congestionam as linhas, tanto das autoridades, quanto dos controles de tráfego aéreo. “Apesar de toda a hierarquia, a cadeia de comando, os equipamentos sofisticados, nada funcionava.

Tivemos que improvisar”, diz Condoleezza. Ou seja, o pânico e a desinformação se espalham pelo país. A confissão da toda poderosa Secretária de Estado de Bush, dez anos depois, é o reconhecimento tácito de que não havia plano de prevenção e o país não estava preparado para um ataque.

Bush tomava conhecimento dos acontecimentos no avião presidencial, que continuava fazendo manobras evasivas para evitar um ataque. As decisões são tomadas por outras autoridades. A insistente ordem de Ben Shiney “Nenhum avião pode ficar no ar”, começou a ser obedecida e surge um novo problema. Onde pousar tantos aviões. Aeroportos começaram a ficar congestionados. Os aviões em rota internacional para os Estados Unidos recebem ordem de voltar ao destino e centenas de viagens com destino aos EUA são abortadas.

Mas enquanto o United 93 voava para a Capital, o chefe dos controladores não sabia onde estavam e o que faziam os militares. Desconhecia também o destino do Presidente Bush. Então, surgem outros heróis anônimos nesse 11 de setembro. Um dos passageiros do voo 93 liga para a esposa e fica sabendo dos atentados. E conclui que seu voo também era um avião suicida, com algum destino especial.

Ao perceber que o avião se dirigia para Washington, a ordem para os caças foi: derrubar o voo United 93. Gravações liberadas agora pelo controle do tráfego aéreo, mostram a voz desesperada de um piloto dizendo aos colegas no dia 11 de setembro: “O comandante da região declarou que podemos abater os aviões que não respondem às nossas ordens, entendeu?"

Como assim? Derrubar um avião de passageiros? Todos sabiam que era uma decisão difícil, mas, considerando que o país enfrentava uma crise grave, algumas soluções acabam redundando na máxima de Jach Welch, quando fala de crise: “Quase nenhuma crise termina sem sangue no chão”. Se o avião era uma ameaça, por que não derrubar? “O Presidente autorizou interceptar e derrubar, se não responderem”, diz o comandante dos caças.

Condoleezza Rice, ao perceber que o ataque que o país sofria vinha de dentro, e não de inimigos externos, e os Estados Unidos mostravam-se despreparados para isso, conclui: “Nesse momento eu entendi que a Guerra Fria tinha acabado”.

O despreparo militar

Marc Sasseville, piloto de caça, recebeu a ordem para abater o avião, mas o F16 dele não estava preparado para o combate. “Não tinha tempo para carregar os mísseis no avião. Eu só tinha munição de treinamento, que não explode no impacto. Sem os mísseis, o único jeito de derrubar o avião seria usando minhas asas para bater nele, abrindo um rombo, batendo no avião”. Ou seja, era quase uma missão suicida. Consumada a batida, seria muita sorte conseguir sair no assento ejetável.

Na falta de comando lúcido, de um líder para comandar a crise, e de aviões militares preparados para o ataque, a reação, ainda que desesperada, veio dos passageiros do voo United 93. Pelo menos dois passageiros lideraram a reação, que impediria o avião de atingir algum alvo em Washington. Especula-se que seriam os edifícios do Capitólio ou da Casa Branca. Nunca se saberá. O governo a principio disse que foi a Força Aérea que havia abatido o United 93.

Mas foram heróis anônimos, a começar pelo papel da aeromoça Betty Ong, que ligou para a American e foi das primeiras vítimas no voo AA 11, que atingiu o WTC, às 8h46. Os passageiros do voo 93 foram os primeiros americanos a reagir fisicamente e com ações concretas ao ataque do 11 de setembro, frustrando o objetivo dos terroristas. Pouco se sabe o que aconteceu dentro do avião. Mas pode-se imaginar. Segundo relatos vazados de celulares das vítimas, diante da reação violenta dos passageiros, os pilotos terroristas perderam o controle e o avião caiu numa zona despovoada de Shanksville, na Pensilvânia. Não há dúvida de que ele caiu por iniciativa dos passageiros. Nesse acidente, morreram 40 pessoas e mais a tripulação. “Pessoas comuns, que quebraram regras, fizeram a diferença no 11 de setembro”, conclui o documentário da CBC.

Nota: Grande parte desta análise da gestão da crise do atentado de 11 de setembro de 2001 foi feita com base no documentário "9/11 State of Emergency", produzido pela CBC News Network, canal de TV americano, em 2010.

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