A crise da mineradora Samarco tem propiciado algumas lições de gerenciamento de crise relacionadas ao meio ambiente, mais pelos erros do que pelos acertos. Existem problemas que ocorrem na gestão das ações dessa crise, muitos pela ação do Ministério Público, e outros na área de relações públicas, quando a empresa tem dificuldade de se comunicar de maneira efetiva e proativa. Ou porque os porta-vozes cometem equívocos.
A Samarco, desde que o ex-presidente da empresa, Ricardo Vescovi, pediu licença para tratar de sua defesa, ficou praticamente sem porta-voz. Eventualmente, algum executivo fala pela empresa, mas dificilmente alguém se lembrará qual é a “cara” da crise da Samarco depois da saída de Vescovi, porque a comunicação da empresa não está centrada numa única pessoa. Com isso, outros protagonistas da crise como os órgãos de meio ambiente, o Ministério Público, as prefeituras ou secretarias estaduais acabam se sobrepondo e confundindo e prejudicando o discurso de crise da empresa.
Os erros da BP e o que podemos aprender
Assim foi com a explosão e o vazamento da plataforma pertencente à British Petroleum, em abril de 2010, no Golfo do México, no litoral de pelo menos cinco estados americanos, um dos maiores acidentes ecológicos ocorridos nos últimos anos no mundo.
Passados seis anos deste acidente, que causou a morte de 11 trabalhadores e derramou, segundo se calcula, 800 milhões de litros de petróleo no Golfo do México, ainda há muita coisa para aprender com os erros ali cometidos. Somente no ano passado, quando fez cinco anos da explosão, a BP e os cinco estados do Golfo, atingidos pela catástrofe, finalmente chegaram num acordo financeiro.
A quantia acordada na ocasião foi de um valor aproximado de US$ 18,7 bilhões (algo como R$ 65 bilhões), e é o maior a ser pago por uma única empresa na história dos EUA. Mas esse foi apenas um dos passivos da empresa. Já que ela há seis anos gastou com indenizações e manutenção de milhares de pescadores que foram afetados pelo vazamento. Sem falar nos custos de limpeza do mar e das praias.
Não importa o custo em termos financeiros, entretanto, Será que a BP realmente irá recuperar o custo que ela causou a ela mesma na forma questionável com que gerenciou sua imagem tão logo a crise estourou?
Durante anos, especialistas e conferencistas de universidades têm citado a forma errada de gerenciar as relações públicas, quando a crise com a plataforma Deepwater Horizon explodiu, em abril de 2010, transformando-se num mantra de “como não fazer”. É sempre lembrado um daqueles comentários lamentáveis do descontentamento do CEO da BP, Tony Hayward, que disse, 15 dias depois do acidente: "Eu quero ter minha vida de volta", ao se referir aos problemas que o acidente tinha trazido para a sua vida. Quase dois meses depois, em junho, ele se desculpou pela "impensada" e lamentável declaração. Mas o estrago já estava feito.
Esse desabafo acabou se transformando em exemplo do que um CEO ou qualquer executivo não deve fazer ou dizer no auge de uma crise, não importa a dimensão do acontecimento. Em função dessas escorregadas, o site PR Daily, publicou artigo de Deborah Watson, consultora de comunicação estratégica, nos EUA. No artigo, em função dos erros primários da BP no quesito PR, a autora escolheu o que ela chama de “cinco caminhos errados que a BP tomou, e o que pode ser aprendido destes erros:
Aqui estão os cinco principais erros da BP, que acabaram contribuindo para arranhar ainda mais a reputação; e o que pode ser aprendido com esses erros:
1. Falha na preparação.
Uma das observações feitas muitas vezes por analistas foi o quão pouco a empresa parecia estar preparada para lidar com uma crise daquele tipo.
Dado o tipo de indústria, é de se pensar que até mesmo uma simples análise dos pontos fortes, pontos fracos, oportunidades e ameaças teria apontado para este tipo de desastre como um cenário possível, em torno do qual a equipe de comunbicação deveria sempre estar preparada para responder.
No entanto, quanto maior sua empresa, é vital conhecer as áreas susceptíveis de crises.
2. Manipulação (ou falta de conhecimento verdadeiro) dos fatos.
Nas primeiras fases da crise, a empresa foi à imprensa dizendo que o vazamento era em torno de 5 mil litros diários de petróleo por dia. Descobriu-se depois que esse montante era de cinco vezes o verdadeiro, mas ainda assim, o porta-voz da empresa minimizou os cálculos, dizendo ser um pequeno vazamento.
Conhecer os fatos e tendo tempo para confirmá-los, é imperativo se você estiver disposto a enfrentar a imprensa para falar sobre a crise. Isso garante credibilidade desde o início.
3. Falta de “compassion*”
Os comentários de CEO Tony Hayward certamente entraram para a história dos PRs em época de crise. Vidas tinham-se perdido na crise e as implicações ambientais e econômicas eram enormes para muitos - mas ele (o CEO) queria sua "vida de volta", numa declaração que sempre será lembrada como das piores coisas que um CEO pode dizer numa crise grave. Convém observar que no momento em que pronunciou essa frase havia 11 empregados desaparecidos. Os corpos nunca foram encontrados.
Esse comentário causou desgosto e aborrecimento por parte da imprensa e do público. Escolha suas mensagens e seu porta-voz sabiamente.
4. Transferência ou terceiriação da culpa.
A BP fez um grande tentativa de jogada pelo fato de a plataforma que explodiu ser propriedade de outra empresa, a Transocean, e ao fazê-lo, foi encarada como se estivesse fazendo uma tentativa para desviar a responsabilidade.
Claro, mencionar outras partes envolvidas, mas ao fazê-lo, forneça mensagens colaborativas sobre como vocês estão fazendo o melhor para resolver rapidamente as questões da crise.
Para a BP, isso pareceu como se a empresa estivesse tentando comprar uma margem de manobra.
5. Estar com raiva e indisponível.
Muitos sentiram que a BP evoluiu como se estivesse irritada com a interferência de imprensa, e que os líderes estivessem muito menos disponíveis em termos de atualizações e comentários do que poderiam ter sido.
Manter (numa crise) seu público no circuito, em intervalos regulares, ajuda a não terminar a crise sem um mínimo de credibilidade. Mostra também que você está mantendo a comunicação ativa e que você não esqueceu o seu nível de responsabilidade ou o fato de que muitos estão agora procurando você para obter respostas sobre a crise.
*Compassion: A palavra não tem uma tradução perfeita em português. Poderia ser “compaixão”. Mas de acordo com o Budismo, “compassion” é mais do que isso; é uma aspiração, um estado mental, querendo que outros se libertem do sofrimento. Não é passivo – e não é somente empatia – mas sim um altruísmo empático, que ativamente luta por libertar o próximo do sofrimento. A compaixão genuína deve ter tanto sabedoria quanto bondade amorosa. (Nota do livro “Gestão de Crises e Comunicação – O que gestores e profissionais de Comunicação precisam saber para enfrentar Crises Corporativas” (Forni, J.J, Atlas, 2015, 2a edição).
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