Não bastassem as crises que há quase dois anos persistem no País, a cada dia somos surpreendidos pelos fantasmas que saem dos armários das delações. Após o vendaval da Petrobras, agora temos o tsunami Odebrecht. Cerca de 77 executivos da empresa firmaram acordo de delação premiada, ainda não homologado. Não por patriotismo, certamente. Mas, primeiro, para tentar salvar a própria pele. E, depois, talvez o emprego. Tudo com o respaldo da Polícia Federal e do Ministério Público.
A cada depoimento vazado, o país se surpreende com os nomes envolvidos e as acusações, todas invariavelmente ligadas a polpudos valores repassados ilegalmente. Se fossem legais, não deveriam nem aparecer numa delação. O mais incrível nisso são os argumentos utilizados no direito de resposta de todos os citados, quando procurados pela mídia. Segue um padrão, assoprado pelos advogados, pela falta de criatividade e inconsistência. Um “repudia com veemência”, outro “não houve caixa dois nem entrega em dinheiro”; ainda outro “a acusação é mentirosa”. Quando não, o citado “negou ter recebido qualquer quantia”.
Ora, há mais de um ano a Odebrecht negocia com o Judiciário e o MP uma delação premiada. Criticada a princípio pelo presidente da empresa, Marcelo Odebrecht, ele acabou cedendo. Dentre as construtoras, a Odebrecht certamente é que sempre esteve mais próxima do poder, em vários governos. No de Lula, além de ter multiplicado por seis o seu faturamento (passou de R$ 17,3 bilhões, em 2003, para R$ 107,7 bilhões, em 2014), o ex-presidente agiu como um caixeiro-viajante, ao desbravar mercados em ditaduras ou países atrasados da África para a empreiteira.
Por que os executivos da Odebrecht iriam concordar em falar sobre o passado nebuloso da Construtora, fazendo acusações falsas? Se, como sabemos, a delação é suspensa se o STF constatar que o acusado mentiu, por que esses executivos iriam arriscar a liberdade, disparando torpedos contra nomes emblemáticos da política brasileira, sem que tivessem alguma prova? É apenas coincidência que as delações, em sua maior parte, sempre convirjam para um mesmo grupo de políticos? Neste caso, os depoimentos atingem principalmente a cúpula do PMDB, com respingos em outros partidos, como a Petrobras batia direto no PT. As respostas, invariavelmente evasivas e repetitivas, soam no mesmo compasso das repetidas por muitos dos presos em Curitiba.
Não sabemos no que essa delação vai dar. Mas dificilmente as lacônicas explicações dos citados terão algum respaldo na opinião pública. As explicações soam como palavras ocas, sem qualquer valor jurídico e reputacional. O que vem ocorrendo e agora se consagra, com esta delação, é a perda total de credibilidade em políticos que estão hoje no comando do País. Se os partidos e o governo já estavam na rabeira em pesquisas de opinião sobre a confiança nas instituições, o que esta delação veio confirmar é que não há nomes na política brasileira dignos e confiáveis para restaurar a confiança nas instituições e que apontem alguma esperança para o futuro próximo. E, com isso, criar um cenário que possa amenizar a grave crise econômica, política e ética que o Brasil enfrenta. O país está órfão. E, como num grande apagão, parece que nem a luz no fim do túnel consegue mais aparecer.