segurança aeroportuariaA ação ousada de um adolescente, nos Estados Unidos, levantou um questionamento sério sobre a segurança dos aeroportos daquele país. Os brasileiros estão acostumados com a paranoia americana por segurança em viagens aéreas. A começar por aquela pergunta idiota, antes do embarque no Brasil, em voos internacionais, se foi você que arrumou a própria bagagem.

Porém, poucos brasileiros sabem que esse stress de revistar bagagens, combinado com a instalação de pórticos, com detectores de metais nos aeroportos, começou exatamente por imposição dos americanos, nos aeroportos internacionais do Brasil. Mesmo antes do atentado ao WTC todos os voos internacionais, partindo para os Estados Unidos, passavam por rigorosa revista. Por isso, a segurança nos aeroportos exclusivamente domésticos é mais relaxada.

Na aventura americana, o adolescente sobreviveu milagrosamente a temperaturas abaixo de zero, dentro do compartimento do trem de aterrisagem de um jumbo que ia da Califórnia para o Havaí. A ousada e irresponsável coragem do jovem pode até achar admiradores nas redes sociais. Mas todos se perguntam como ele teve acesso a um avião de passageiros, com tanta facilidade, em primeiro lugar. E se o que está sendo feito no país, em termos de segurança, é suficiente para garantir acesso somente às pessoas credenciadas no entorno dos aeroportos, já que ele entrou, sem ser incomodado por uma cerca lateral. Nenhum alarme foi dado para essa estripulia perigosa.

Desde o início dos registros desse tipo de caso na aviação internacional, em 1947, 96 passageiros clandestinos teriam tentado embarcar em 85 voos. Destes, 73 teriam morrido e apenas 23 sobrevivido.

O repórter Mike Hellgren da afiliada da CBS – WJZ, em Baltimore, Maryland, EUA, em artigo publicado no site da emissora, tentou encontrar algumas respostas para as dúvidas surgidas após a aventura que quase custou a vida do adolescente.

Há centenas de quilômetros de cercas de arame farpado em torno do aeroporto onde o jovem se esgueirou para o avião, juntamente com uma rede de câmeras de segurança e monitoramento de pessoal em terra. Depois que ele escalou uma cerca e acessou um jato da Hawaiian Airlines, muitas questões vieram à tona, em todo o país, sobre a segurança do aeroporto, uma das obsessões americanas após o atentado de 11 de setembro de 2001, diz o repórter.

"Alguma coisa quebrou aqui. Talvez precisemos gastar mais tempo olhando para o lado de fora de nossos aeroportos assim como para os seus perímetros, dado o fato de que nós nos deparamos com uma brecha", disse o especialista em segurança de transporte Mark Rosenker. "Ele estava determinado e, se você está determinado, você irá superar essas cercas, onde quer que você esteja", disse Joy Perry, um outro especialista.

“As cercas no aeroporto de San Jose possuem, aproximadamente, 1,80 metro. No aeroporto BWI (Baltimore-Washington International Airport Thurgood Marshall), nos arredores de Washington, elas são muito mais altas e cobertas com arame farpado. Não houve incidentes semelhantes aqui", diz o repórter. Naturalmente, o porta-voz da BWI Marshall não irá revelar todos os procedimentos de segurança. Segundo ele, "Existem muitas medidas de segurança, algumas são altamente visíveis, mas há outros procedimentos e protocolos que os clientes não reconhecem."

Segundo o repórter da WJZ, “se você estacionar naquela estrada, dentro de cinco minutos, alguém está atrás de você perguntando por que você estacionou ali”. Isso não aconteceu com o adolescente. Mas, de acordo com um relatório do Congresso americano, feito na década após o 11 de setembro, havia quase 1.400 brechas em outros lugares em todo o país, incluindo um passageiro clandestino encontrado morto, após o desembarque nas proximidades do aeroporto Dulles, em Washington, em fevereiro passado. Não acredite que hoje, anos depois, todas aquelas brechas foram fechadas. Há dois anos, o FBI prendeu um estudante, que resolveu testar a segurança em aeroportos, fazendo uma bomba doméstica e tentando passar pelos agentes. 

O jovem deputado ativista, do partido Democrata, Eric Swalwell, anunciou que irá convidar o Government Accountability Office, órgão responsável pela Auditoria, Avaliações e Investigações do Congresso dos Estados Unidos, “para fazer uma avaliação em todo o nosso país dos perímetros de nossos aeroportos".

O repórter da WJZ também descobriu que, enquanto a Transportation Security Administration-TSA (agência ligada ao órgão de segurança doméstica dos EUA, criada após o 11 de setembro de 2001), gastou US$ 80 bilhões em segurança, desde a sua fundação, nenhum centavo desse dinheiro foi destinado para a melhoria dos perímetros dos aeroportos. Ou seja, protegeu o prédio da casa, mas deixou de fazer muros ou cercas.

O governo optou por não responsabilizar o adolescente que “pegou” carona no voo para o Havaí, pois ele não representava nenhuma ameaça. Ele só estava tentando ver a mãe na África e entrou no primeiro avião que viu. Mas sua aventura deixou os serviços de segurança numa tremenda saia justa.

Segurança virou paranoia após 11 de setembro

Algumas premissas dos especialistas em segurança. Não há segurança absoluta. A segurança deve ser proporcional à ameaça. O dono de uma casa na periferia de S.Paulo, por exemplo, ou na maior parte das grandes cidades brasileiras, deixaria as portas abertas de sua casa a qualquer hora do dia ou da noite? Naturalmente não. Porque a ameaça de roubo, invasão é grande. Ele constrói muros, coloca alarmes, cercas eletrificadas, contrata segurança.  

Pois em Punta Del Leste, balneário uruguaio de 15 mil habitantes, que recebe 700 mil turistas no verão, as casas luxuosas dos veranistas, na sua maioria, não têm muros ou cercas. São completamente vulneráveis. E não há assaltos. Por que? Porque o policiamento é ostensivo, noite e dia; a repressão é muito violenta e turistas mal intencionados são “convidados” a se retirar da cidade. Não há contemplação. Como a ameaça é baixa, a guarda também baixa. São raríssimos os assaltos em residências em Punta Del Leste.

Infelizmente, isso não acontece nos aeroportos americanos, sempre sob grande ameaça de ataques terroristas. Pelo menos na mente dos órgãos de segurança do país. E essa paranóia contaminou todos os aeroportos do mundo. Viajar e enfrentar vários aeroportos transforma-se num tremendo stress, porque o passageiro necessita passar por inúmeras e repetidas revistas, com longas filas, que atrasam voos e incomodam os turistas. Essa foi a herança do 11 de setembro, a maldição de Bin Laden.

No Brasil, não há ameaças de terrorismo. Mas as administradoras de aeroportos entraram na paranóia americana e acabam confiscando qualquer inofensiva tesourinha ou canivete, como se fosse uma ameaça na mão do passageiro. O curioso e até ridículo de toda essa obsessão por segurança é ver, por exemplo, no aeroporto de Heathrow, em Londres, dos mais movimentados do mundo, os seguranças confiscarem qualquer objeto pontudo que o passageiro carregar. Até grampos de metal dos cabelos, com pontas afiadas. Quando você chega no avião, em algumas companhias aéreas, você recebe talheres: colher, garfo e faca de metal. E aí? Qual a lógica dessa segurança? Nenhuma.

Os “muros” ou cercas estão abertos, como aconteceu nos Estados Unidos, e um clandestino pode subir a bordo e se instalar no trem de aterrisagem sem que ninguém o incomode. Há alguns anos, a TV Globo fez reportagem no Jornal Nacional, mostrando a vulnerabilidade dos aeroportos brasileiros, chamando o Galeão, do Rio de Janeiro, de “queijo suíço”, tal a quantidade de “buracos” na segurança encontrados naquele aeroporto.

A realidade é que quanto mais você aumenta a segurança, mais desconforto gera nos passageiros. A exemplo do que acontece nos Estados Unidos. Os aeroportos brasileiros se adaptam ao grau de ameaça do país. Aquela revista costumeira feita nos grandes aeroportos em milhões de passageiros por ano acaba caindo numa rotina burocrática. Ela não impede que alguém mal intencionado, que realmente queira cometer um crime grave, entre no avião e se iniba com alguns funcionários terceirizados, que ficam o dia todo olhando bolsas e sacolas desfilando pelos scanners.

As ameaças estão em outros locais, pouco vigiados e que não fazem parte da rotina de segurança. Como aconteceu com o jovem africano, nos Estados Unidos. Sem grande preparo e nenhuma má intenção, ele descobriu o ponto fraco do aeroporto de San Jose, na California.  

Tradução: Jessica Behrens. Edição: João José Forni


 

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