criancas em perigoFérias sugerem divertimento, alegria e liberdade. Mas o que deveria ser momentos de prazer, podem se transformar em dramas irreparáveis, em tragédias. Várias crianças, neste verão, foram vítimas de acidentes fatais, em que ficou evidente a irresponsabilidade de empresas e o descuido, ainda que involuntário, de pais e responsáveis. Elas acabaram presas fáceis da falta de ações de prevenção e também da falta de fiscalização do poder público.

A primeira semana do ano, no Brasil, foi terrível para as crianças, principalmente as que frequentaram parques aquáticos. Praticamente não houve um dia sem algum acidente fatal. Mas, lamentavelmente, em quase todos ficou evidente a negligência de quem deveria protegê-las. E não adianta colocar a culpa na "fatalidade".

Não é um problema grave restrito ao Brasil. Nos EUA, são registrados nove afogamentos por dia em piscinas. Esse tipo de acidente já é a segunda causa de morte entre crianças de 1 a 14 anos naquele país. No Brasil, 7 mil pessoas morrem a cada ano por afogamento, um número que só tem crescido. Grande parte são crianças e adolescentes. 65% se afogam em água doce, ou seja, rios, açudes, barragens, cachoeiras ou piscinas. Os dados são do Corpo de Bombeiros de S. Paulo.

Resumidamente, recordemos alguns acidentes fatais, que a mídia repercutiu nos últimos dias no Brasil, acontecidos apenas na primeira semana do ano.

Caso 1 - Em Caldas Novas (GO), cidade a 300 km de Brasília, que atrai milhares de turistas nas férias, por causa das águas termais, um menino de 7 anos teve o braço sugado no ralo da piscina do Residencial Privé das Thermas 1. Os frequentadores tentaram puxar a criança, mas não conseguiram, devido à força da sucção. Resultado, ele ficou pelo menos 10 minutos submerso e teve várias paradas respiratórias. Foi socorrido com vida, mas morreu no hospital alguns dias depois.

A falta de socorro, no caso, foi fatal. A piscina era frequentada sobretudo por crianças e só tinha um metro de profundidade. Onde há crianças, é preciso atenção redobrada e, no caso, certamente não havia salva-vidas. E nem sequer um empregado para desligar a bomba rapidamente, após o alarme dos familiares, segundo relato dos parentes. Para o tio do menino, Kelvis Costa, o hotel “não ofereceu nenhum suporte e ainda impediram a polícia de entrar em um primeiro momento para a perícia”.

Quando não há transparência na explicação de acidentes e a empresa negligenciou, a primeira coisa que ela procura evitar é a presença da polícia e da imprensa. Esse é um comportamento equivocado que só piora a situação. Não é a primeira vez que acontecem acidentes desse tipo nos hotéis de Caldas Novas. Em 2006, um outro menino também foi sugado numa piscina que estava sendo esvaziada.  

Caso 2 – Menina de 3 anos cai em vão da escada rolante do Aeroporto do Galeão. A criança sofreu traumatismo craniano e na face, foi para a UTI, mas já foi liberada para o quarto. O vão por onde a menina passou, segundo peritos que o examinaram, está alguns centímetros maior do que recomendam as normas internacionais. O Procon do RJ também achou outros locais que ofereciam perigo a crianças.

A Infraero se defende, dizendo que cumpriu as normas brasileiras. O fato concreto é que a menina passou no vão e correu sério risco de vida, independentemente de se atribuir essa responsabilidade aos pais, que também deveriam protegê-la, ou à irregularidade no tamanho da abertura. Se o corpo dela passou pelo vão, e aeroporto é um local muito frequentado por crianças, algo estava errado e deveria ter sido percebido por uma Auditoria de Vulnerabilidades. Prédios públicos, com grandes aglomerações, devem fazer, pelo menos de seis em seis meses uma Auditoria de Vulnerabilidades, conforme preconizam os institutos de prevenção e gerenciamento de riscos.

Caso 3 – Menina de 11 anos morre afogada após ter os cabelos sugados por sistema de drenagem de piscina em Linhares (ES). A garota ainda foi levada para o hospital, mas não resistiu. É o terceiro caso de morte de crianças em acidentes em piscinas, desde o dia 1º de janeiro, ou seja em oito dias. Acidente semelhante aconteceu com a menina Mariana Rabelo Oliveira, de 8 anos, em Belo Horizonte, no dia 03/01. Ela também teve os cabelos sugados pelo ralo da piscina do Jaragua Country Club.

Caso 4 – Menino de 13 anos morre eletrocutado na cidade satélite de São Sebastião, próxima a Brasília, em 5 de janeiro. Perto da casa onde morava, ele foi soltar pipa e foi eletrocutado ao tocar em fios caídos de poste da Companhia Energética de Brasília (CEB). A família e os moradores alegaram que os fios estavam caídos há três meses e que a CEB tinha sido notificada. A CEB nega, mas reconheceu que os fios não deveriam estar caídos e no fim do dia (portas arrombadas...), a empresa começou a consertar o problema.

Caso 5 - Garoto se afoga em piscina particular. Um garoto de aproximadamente 4 anos se afogou numa piscina de uma chácara particular, em Vicente Pires, localidade que fica nos arredores de Brasilia, na segunda-feira (6). Foi o segundo caso na mesma semana com crianças da cidade.

Nesse contexto, poderíamos seguir enumerando vários outros casos de negligência de empresas e até dos parentes com a segurança das crianças apenas nos meses do verão. Em todos eles, certamente faltaram ações mínimas de prevenção de crises. Como explicar que um hotel, que vende lazer, conforto e alegria, não toma cuidado com a segurança dos hóspedes, principalmente crianças. Como explicar que numa piscina de um hotel, em plenas férias, com grande aglomeração de pessoas, não haja salva-vidas e empregados para monitorar os hóspedes.

Se um estabelecimento, seja hotel, clube ou qualquer outro, que presta serviços ao público, é relapso com a segurança dos frequentadores, quem garante que também não seja em outros itens, como na higiene dos alimentos, dos utensílios e nos demais serviços prestados? Qual a confiança para um hóspede permanecer no local, se o estabelecimento negligencia naquilo que de mais precioso existe na face da terra: a vida humana.

É óbvio que todos os locais frequentados por crianças devem ter atenção redobrada. O diretor médico da Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático (Sobrasa), David Szpilman, em entrevistas ao Correio Braziliense e à CBN,  explica quais os cuidados básicos em piscinas, principalmente quando frequentada por muita gente e crianças. Para facilitar a memorização, ele resume as recomendações com as iniciais da palavra “água”.

A: Atenção 100% no seu filho ou na criança pela qual você é responsável.

Não se terceiriza cuidados com filhos. A não ser a quem você confia cegamente. Os pais  ou responsáveis são os primeiros guarda-vidas das crianças, seja em parques de diversões, piscinas, hotéis, jogos, shoppings e grandes aglomerações. 

Basta recordar o que aconteceu com a menina  Madeleine McCann, que em maio de 2007 desapareceu do apartamento alugado pelos pais em um resort, na praia da Luz, Algarve, Portugal. Os pais foram jantar e a deixaram dormindo no apartamento do hotel. Até hoje, depois de tantos alarmes falsos, suspeitas até dos próprios pais, versões desencontradas da mídia, a menina não apareceu. Pode-se até discutir as hipóteses para o desaparecimento. Até colocar em questão a segurança do hotel, que permitiu a estranhos, se foi o caso, entrar, sequestrar e sair com a menina. Mas o fato é que ela sumiu do apartamento e isso mostrou uma falha grave na segurança. .

G: Guarda-vidas sempre presente.

Não há como manter piscinas públicas sem guarda-vidas. Vale para adultos e vale mais ainda para piscinas de crianças. O tempo todo. Alguns segundos de descuido e a criança cai na piscina. Se não souber nadar, vão ocorrer novas tragédias. As empresas ou clubes querem economizar e, muitas vezes, colocam um salva-vidas para várias piscinas. Isso não adianta. Em creches ou escolas com crianças até 5/6 anos, recomenda-se um adulto para cada grupo de 5 crianças.

U: Urgências – saiba agir em situações de afogamento.

Essa recomendação do Dr. David vai desde a iniciativa para socorrer alguém afogado até a prevenção de chamada de socorro. Não adianta ter empregado perto da piscina que não sabe sequer o telefone dos serviços de salvamento da cidade para pedir socorro; ou não tem a mínimia noção de primeiros socorros. Aqui vale muito a máxima de que prevenir crises não significa apenas conhecer as ameaças e evitá-las. Mas também treinamento, simulações do acidente? Ou são apenas teorias que estão no papel e ninguém experimentou fazer?  Saber agir é ter o mapa de todas as ações para o caso de um socorro rápido. Pelo menos nos acidentes mais prováveis. Como nas corridas de Fórmula 1.

A: Acesso restrito.

Neste caso, a máxima se aplica a crianças. As piscinas devem ser cercadas para evitar que uma pessoa que não sabe nadar caia na piscina e acabe se afogando. As cercas devem ser altas o suficiente para a criança não pular e os portões devem ficar trancados. O Dr. David não recomenda cobrir a piscina com lonas, como fazem alguns pais. Para ele, é uma prática perigosa.

Acesso restrito significa que piscinas de adultos e as de crianças, que representem perigo, devem ser fechadas para não dar acesso a crianças, principalmente em hora em que a fiscalização não é tão rigorosa. Se formos analisar os casos fatais ocorridos de dezembro para cá, em todos, sem exceção houve algum tipo de negligência. Se as crianças estivessem sob vigilância, as tragédias poderiam ter sido evitadas.

S: Sucção – use ralo antissucção e meios de interrupção da bomba.

Parece uma recomendação óbvia. Mas, pelo jeito. nos hotéis ou clubes onde aconteceram as tragédias certamente não havia esse tipo de ralo. Como admitir que nesses locais, com piscinas com esse tipo de ralo, já não estejam em uso bombas antisucção, sabendo-se que crianças em anos passados já foram vítimas desse tipo de acidente?

Será que esses hotéis ou clubes algum dia pensaram em fazer uma simulação de crise, utilizando um caso de afogamento na piscina? Essa seria uma boa pergunta a fazer ao hotel, na hora da reserva. Ou os locais de serviços ao público se limitam a, uma vez por ano, fazer uma simulação de incêndio, apenas porque o Corpo de Bombeiros exige?

Barbárie no Maranhão vitima mais uma criança

"Nós, adultos, de algo sempre somos culpados. Mas as crianças, que culpa podem ter as crianças?" (Ernesto Sábato).

Caso 6 – Para encerrar a semana, em que o Anjo da Guarda das crianças tirou folga, bandidos incendiaram ônibus no MA e menina de 6 anos, sem conseguir sair do ônibus, morre queimada. A pequena Ana Clara e sua mãe não conseguiram sair antes do atentado, e foram atingidas pelas chamas. A menina morreu e a mãe está em estado grave. Mártir da insensatez de bandidos que dominam o presídio de Pedrinhas e fizeram protestos contra o governo local e vítima da incúria do governo do estado e da polícia em lhe dar segurança. Nesse caso, o estado enfrenta uma crise grave de governabilidade, pois mantém um presídio onde quem manda são os bandidos.

Nas crises, de qualquer tipo, seja nas guerras, nos desastres naturais, ou em situações de caos urbano, protestos, terrorismo, o que a população espera dos governos? segurança. É dever das autoridades, dos governos dar segurança ao cidadão, principalmente àqueles que usam o transporte público. Ninguém que sobe num ônibus nas cidades brasileiras deveria estar preocupado com a própria segurança. Deveria sentir-se protegido pelo estado. No caso, portanto, houve uma falha grave do poder público.

9 recomendações básicas para evitar tragédias em piscinas.

Fantástico - Rede Globo - Ralos de piscina trazem perigo de vida para crianças.

Swimming Injury Statistics

Folha de S. Paulo - Vidas Sugadas - Mãe cuida da filha em coma irreversível depois de ficar preso no ralo.

Especialista ensina o que fazer em casos de afogamento.

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