sede_do_bbO Banco do Brasil anunciou esta semana o resultado de 2010: lucro líquido de de 11,7 bilhões, crescimento de 15,3% sobre 2009. Foi o melhor resultado na história bancária do país. O BB é uma empresa de economia mista, com 59,2% do capital pertencente ao Tesouro Nacional. Mas o que isso tem a ver com comunicação e crise?

Esse resultado é emblemático, porque o BB, uma empresa de 200 anos de história, tem um longo passado de crises. Os historiadores até divergem quanto ao bicentenário do BB, porque a empresa quebrou três vezes, no século XIX. De qualquer modo, convencionou-se historicamente que a fundação do banco é 12 de outubro de 1808, quando surgiu o primeiro Banco do Brasil. O BB atual, que exerceu funções de Banco Central até 1964, atua ininterruptamente desde o fim do século XIX. 

Ao anunciar esse lucro recorde entre os bancos nacionais, convém voltar a 1996, quando o Banco do Brasil mostrou um dos maiores prejuízos da indústria bancária até então: R$ 7,5 bilhões. Na ocasião, o Tesouro Nacional, seu controlador, precisou fazer um aporte de R$ 8 bilhões para sanear o Banco. A decisão foi muito questionada, principalmente por segmentos contrários à existência de um banco estatal e favoráveis à privatização. Por que o contribuinte deveria arcar com R$ 8 bilhões para sanear um banco com problemas? 

Na ocasião, o Banco do Brasil anunciou um grande programa de saneamento, que envolvia desde negociações com o fundo de previdência dos empregados, com quem tinha passivos, até uma virada no foco de negócios da empresa, com a entrada em segmentos até então não explorados pela empresa. O banco utilizou a força da marca para impulsionar novos negócios.

Junto com o programa de saneamento, o BB fez uma reestruturação nas diretorias. Criou unidades de negócio, que acabaram pautando a atuação nos últimos anos, principalmente com foco em determinados nichos, onde os bancos privados já atuavam. Isso permitiu uma ampliação na base de clientes e no volume de negócios.

Os resultados não demoraram a aparecer. Ainda nos anos 90, o Banco começou a dar lucro e melhorar seu perfil de negócios. Fez várias operações para aumento de capital, com boa receptividade no mercado nacional e internacional, o que acabou elevando o valor das ações na Bolsa de Valores. O mercado começou a encarar o BB de outra forma. E a empresa começou a devolver, com juros, o aporte realizado pelo Tesouro. 

Grandes investimentos em tecnologia acabaram proporcionando o aumento de clientes, a expansão da rede e a utilização da internet como um portal de negócios. Hoje a quase totalidade dos negócios do banco são feitos via eletrônica. Tudo isso, somado a uma marketing agressivo e moderno, com foco nos clientes jovens, grandes corporações e nas pequenas e médias empresas. Apesar do prejuízo, os números indicavam que a marca BB não tinha perdido força.  

Ou seja, o anúncio de um mega prejuízo em 1996 não deixou de representar uma grande crise para o Banco do Brasil. Não é fácil um banco enfrentar o mercado com uma notícia dessas. Basta ver o que aconteceu na crise econômica recente (2007/2008), quando só nos Estados Unidos mais de 50 bancos quebraram. Aqueles que conseguiram sobreviver, após prejuízos vultosos, saíram com a imagem bastante arranhada. 

Mas a crise também pode ser uma oportunidade. A empresa pode ser repensada. Em alguns casos até a cultura da organização precisa ser questionada, como aconteceu com o Banco do Brasil. Os últimos 15 anos significaram, muito provavelmente, os mais profícuos de sua história. Mesmo que no período tivesse enfrentado outras crises, até porque as corporações não estão imunes aos solavancos do mercado, principalmente uma empresa estatal, sujeita a interferências políticas e a eventuais intervenções do governo. 

O lucro recorde agora apresentado se deve, em grande parte, ao trabalho realizado nos últimos 15 anos, por várias administrações. Deve-se sobretudo ao perfil técnico imposto à forma de administrar o BB, onde todos os diretores são, estatutariamente, funcionários de carreira e as indicações políticas, inevitáveis numa empresa do governo, não têm força suficiente para contaminar as decisões técnicas ou, pelo menos, para comprometer seus resultados. Para eventuais denúncias de interferência política ou erros de gestão, existem os processos de fiscalização, auditorias, e a própria cobrança da corporação, dos sindicatos, dos acionistas e da sociedade. Por estar na vitrine, o Banco do Brasil vive sob constante radar da imprensa. O que é bom para a empresa, para o controlador e para a sociedade.  

A empresa tem uma força corporativa muito grande. De certo modo, isso tem servido como um escudo de proteção. Eventuais interferências políticas são minimizadas pela postura do corpo técnico, todos funcionários concursados, até porque todas as decisões da administração, a partir das mudanças estruturais, passaram a ser colegiadas. Aliado a isso, os investimentos nas pessoas fazem uma grande diferença, porque só se reverte um cenário negativo com empregados treinados e motivados.

Ou seja, quem se debruçar sobre a história recente do BB, principalmente após o prejuízo de 1996, descobrirá que um cenário negativo, para ser revertido, implica um conjunto de ações que leva anos para maturar. É um caminho longo, que precisa do apoio dos controladores  e de muita disposição dos empregados para ser trilhado. 

Existe outra lição para os governos e o mercado nessa virada do BB. O fato de ser estatal, controlada pelo Tesouro, não significa necessariamente sinônimo de ineficiência ou uso político. O estatuto da empresa, a governança corporativa, a escolha de técnicos para a administração e a visão estratégica dos governantes podem fazer a diferença, desde que o governo tenha limites para interferir na administração. E nem seja loteada politicamente, como é costume no Brasil.  

No caso do BB, além de algumas dessas prerrogativas, um mercado em expansão e a marca forte foram, provavelmente, decisivos para superar anos de utilização política e empréstimos mal concedidos pela instituição.. Está na hora de a mídia se debruçar sobre o case BB e analisá-lo com mais visão de mercado e menos estigma político. Talvez consiga explicar melhor, por que a crise levou bancos e empresas de seguros, historicamente fortes na Europa e nos Estados Unidos, a precisar do socorro dos governos e até quebrar. E por que outras empresas estatais ou autarquias, no Brasil,  vivem com seus nomes permanentemente associados à crise.

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