O mundo sofre, em alerta total, uma crise na área da saúde, mas que tem impactos decisivos no âmbito econômico, politico e social. A forma como alguns países, sobretudo os mais desenvolvidos, estão administrando a crise do coronavírus poderá determinar o sucesso ou o fracasso de políticas públicas, com repercussão na economia e até mesmo na política.
A disseminação do coronavírus, a partir da China, mostra a vulnerabilidade da saúde mundial, diante de um vírus que – repentinamente - tem a capacidade de impactar economias sólidas como as da China, Estados Unidos, Reino Unido, Coreia do Sul e Japão. E parar completamente cidades de 11 milhões de habitantes, como Wuhan, na China. Expõe também os riscos da globalização. Um cidadão colombiano, que mora no Brasil, esteve em fevereiro na Espanha, Alemanha, Itália e Áustria e trouxe na bagagem o coronavírus. Ele é um dos 13 pacientes em quarentena domiciliar no país. Isso mostra a fragilidade dos mecanismos de proteção e gestão de riscos de epidemias mundiais, diante dos deslocamentos fáceis, quando pessoas e aviões cruzam continentes com extrema rapidez e facilidade.
A experiência da crise do H1N1 parece ter dado à área da saúde brasileira know-how bastante para fazer uma boa gestão da ameaça do coronavírus. O Brasil tem muitas vulnerabilidades na área da saúde, principalmente em decorrência de situações que transcendem até o ministério da Saúde, como por exemplo, o baixo índice de saneamento do país, os acidentes climáticos, como enchentes, seca, queimadas, falta de prevenção de endemias, a quantidade de famílias em situação vulnerável, todas causas de doenças que a falta de recursos e a má gestão do país não conseguem amenizar. Mas, independentemente disso, até agora a ameaça do coronavírus vem tendo uma gestão bastante profissional por parte do ministério da Saúde, Anvisa e das secretarias de saúde estaduais. Em relação a países mais adiantados, O Brasil adquiriu experiência, como reconhece a própria OMS, por crises de saúde anteriores, algumas bem administradas e outras com falhas, como as da dengue, zica, chincungunya e sarampo.
Impacto na economia
A crise do coronavírus transcende a área da saúde: a economia mundial já sente o impacto, pelo fechamento de indústrias, escolas, comércio, interrupção de atividades culturais e religiosas, cancelamento de eventos, viagens e reuniões, principalmente em países como China, Japão, Itália, Reino Unido, Coreia do Sul, Irã, EUA e outros. A indústria do turismo é das mais prejudicadas. Empresas estão dispensando empregados, por economia, porque a demanda caiu a zero, na Grã-Bretanha. A incerteza e desconfiança sobre o possível impacto e duração do vírus fez a área de negócios na Europa entrar em compasso de espera. Economistas dizem, segundo o The Times, que o choque é provavelmente mais severo porque a crise atinge a cadeia de suprimentos e da demanda, simultaneamente. Estimativas admitem que a crise pode resultar em uma redução de US$ 50 bilhões nas exportações em valor global corrente. Anteriormente, o FMI previa que o crescimento global aumentaria para 3,3% este ano, acima dos 2,9%, em 2019. Mas essa previsão certamente não se confirmará, após o coronavírus.
Grandes companhias aéreas suspenderam voos para países com alto risco de contágio. Cenas impensáveis, como as da cidade de Milão, na Itália, ou metrópoles da China, com milhões de habitantes, totalmente paradas, lembram filmes de catástrofes. Talvez só na II Guerra ocorreram cenas parecidas. Passageiros idosos, grupo de maior risco do coronavírus, cancelam ou protelam viagens. Os cruzeiros marítimos se transformaram em perigosos focos de contaminação.
Segundo a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), “além de seus efeitos preocupantes na vida humana, a nova cepa de coronavírus (COVID-19) tem potencial para desacelerar significativamente não apenas a economia chinesa, mas também a economia global. A China se tornou o centro de fabricação central de muitas operações comerciais globais. Espera-se que qualquer interrupção na produção da China tenha repercussões em outros lugares, por meio de cadeias de valor regionais e globais“.
É incalculável o prejuízo financeiro em negócios que deixaram de ser feitos de janeiro para cá. Apesar de um aparente controle da disseminação do vírus, o impacto na economia agravará ainda mais a situação econômica de países que não tinham ainda se recuperado da crise de 2008. Analistas preconizam que o impacto pode até ser maior do que o previsto. Hoje, a China sozinha contribui com mais de 16% do PIB mundial e é a segunda economia depois da dos EUA. Entre as economias mais afetadas, estão União Europeia (US$ 15,6 bilhões), Estados Unidos (US$ 5,8 bilhões), Japão (US$ 5,2 bilhões), Coreia do Sul (US $ 3,8 bilhões), Taiwan (US$ 2,6 bilhões) e Vietnã (US$ 2,3 bilhões).
A IATA estima que o setor aéreo será um dos mais afetados, com perdas, num cálculo otimista, de US$ 63 bilhões (U$ 12 bilhões apenas na China) e, na pior das hipóteses, US$ 113 bilhões, em 2020. Projeta-se que 4 milhões de empregos podem ter-se evaporado, ante a disseminação do vírus e em consequência da redução do crescimento da China, para 4,5%, ante uma média de 6% no trimestre anterior. Caso a China não consiga controlar o vírus, já se calcula que 42% da economia do país será afetada.
Catastrofismo? Pode até alguém admitir um certo exagero nas corridas por máscaras e álcool gel, como ocorre no Brasil e em outros países. Mas, enquanto não se deter a disseminação do coronavírus, todos devem trabalhar sob a ótica de uma crise grave, que monopoliza as ações de todos os governos. A revista The Economist, em matéria de capa que acaba de circular, diz que “não é uma luta justa, mas é uma luta que muitos países enfrentarão da mesma forma. Deixada em si mesma, a pandemia de covid-19 dobra a cada cinco a seis dias. Os governos podem diminuir esse ritmo feroz, mas o tempo burocrático não é o mesmo que o tempo do vírus. E, no momento, governos de todo o mundo estão sendo deixados no chão.“
Para a The Economist, “a doença está em 85 países e territórios, acima dos 50 da semana anterior. Mais de 95.000 casos e 3.200 mortes foram registrados. No entanto, nossa análise, baseada nos padrões de viagem de e para a China, sugere que muitos países que viram dezenas de casos têm centenas mais circulando sem serem detectados. Irã, Coreia do Sul e Itália estão exportando o vírus. Os EUA registraram 159 casos em 14 estados, mas a partir de 1º de março, erradamente, haviam testado apenas 472 pessoas quando a Coreia do Sul estava testando 10.000 por dia. Agora que os Estados Unidos estão olhando, é certo encontrar dezenas de infecções - e possivelmente descobrir uma epidemia em fuga.”
O Irã, que provavelmente não tem um sistema de saúde avançado, entre os países menos desenvolvidos, é o que enfrenta a pior situação. A China parece ter entrado numa fase de regressão dessa ameaça de endemia, com grande número de pacientes curados. Mas, pela velocidade com que os casos estão chegando em outros países, é possível deduzir que o coronavírus é uma fera que ainda não foi domada.
Fotos: Meric Greenbaum. Da financeira IMC. Foto: Timothy A. Clary – AFP/Getty Images; Capa da revista The Economist.
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