Francisco Viana*
A tragédia não chegará tão cedo ao último ato e seu desfecho é imprevisível. Impeachment do presidente Michel Temer? Prisão do senador Aécio Neves e de outras das cerca de duas mil pessoas que receberam propinas dos irmãos Batista, da JBS? Eleições indiretas ou diretas para escolha de novo Presidente da República? Cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE?
As perguntas são tantas que é prudente não fazer previsões. De concreto, o que se pode dizer do terremoto político que se abateu sobre o país desde a divulgação da delação premiada de executivos do JBS são duas ou três coisas. Primeiro é que a mídia brasileira não parece disposta a poupar ninguém. Tanto que Michel Temer e Aécio Neves foram tratados da mesma forma, ou pior, do que Eduardo Cunha quando este caiu em desgraça. Ou Dilma Rousseff na temporada que antecedeu o impeachment. Preponderou a relevância da notícia e a busca da preferência do público. A corrida para ocupar espaços foi tanta que a tragédia chegou a soar como uma comédia tendo o dinheiro como pano de fundo, tal como em A Comédia Humana de Balzac.
Segundo, o Planalto demorou a reagir. Só no dia seguinte à divulgação da nota de que Temer teria autorizado a compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha é que levou a prática a estratégia de desqualificar a gravação. Aí, o circo político já estava pegando fogo e a reputação do presidente danificada pelo intenso noticiário, com a gravação da conversa entre um dos donos da JBS, Joesley Batista, e Michel Temer sendo repetida à exaustão pelas Tvs, como acontece com as chamadas de novelas. Chegou a ser cansativo acompanhar o noticiário. A gravação banalizou-se. Além disso, os pontos da gravação que incriminam Temer foram enfatizados pelo noticiário, sobretudo na TV.
Ninguém teve a ideia - e seria vital - de que uma crise, qualquer que seja ela, deve ser debelada nos seus momentos iniciais. Caso contrário, como aconteceu, se propaga igual a fogo num rastilho de pólvora se transformando num colossal incêndio.
Também faltou rapidez na análise da fita para verificar sua autenticidade ou se foi ou não editada. Tudo isso deveria ter acontecido no mesmo dia da eclosão da crise, 17, quarta-feira, mas não aconteceu. E isso amplificou o descrédito para a versão oficial. O problema, pode-se argumentar, é que Temer e Joesley realmente se encontraram e o diálogo gravado realmente aconteceu. Isto tornou as coisas muito difíceis. Comunicador não é mágico. Pode ser bombeiro ou ilusionista, porém não controla a realidade. Em todo caso, fica o episódio para ser analisado e servir de exemplo.
Terceiro, ficou evidente que, a despeito da ampla divulgação das prisões da operação Lava a Jato, a corrupção continua a grassar no país. Ou seja, as prisões não têm tido poder de dissuasão e as práticas criminosas persistem. E em espiral crescente.Tem sido assim desde as prisões do chamado mensalão, um crime menor se comparado com o que veio a seguir.
O que se pode dizer, por fim, é que o contexto é dos mais adversos para o governo. As sucessivas denúncias de corrupção corroeram sua já escassa aceitação e as manifestações públicas, se bem que pouco intensas , atestam a sua impopularidade. Fica, assim, cada vez mais difícil sair da escuridão para encontrar a luz.
Quais serão os próximos atos? Resta aguardar. Um detalhe: a tragédia Brasil, Sófocles, Euripedes e Ésquilo, os grandes dramaturgos da Grécia Antiga, não escreveriam melhor. Não só os falsos heróis estão sendo desmascarados, como as vítimas das ambições estão por toda parte. O Brasil está mostrando sua cara. Não há mais lugar, porém, para ilusões.
Francisco Viana é jornalista e doutor em filosofia política ( PUC-SP).