Francisco Viana *
Uma era acabou no Brasil. A era da impunidade.
Com as prisões do senador Delcídio Amaral, líder do governo, e do banqueiro André Esteves, um dos 13 homens mais ricos do Brasil, segundo a revista Forbes, a Operação Lava Jato transborda da Petrobras e do universo das construtoras para os universos da política e das finanças. O poder desloca-se para o STF.
Era uma tendência irrefreável. O Congresso, tragado por sucessivos escândalos, o caso Eduardo Cunha hoje à frente, perdeu credibilidade. Os senadores que aprovaram a prisão de Delcídio não tinham alternativa: estavam sitiados pela vigorosa torrente dos fatos. Ou ficavam do lado da lei ou seriam execrados pela sociedade. O senador Delcídio, ao que tudo indica, ultrapassou as colunas de Hércules, isto é, não respeitou qualquer limite. Defendê-lo seria optar pelo indefensável.
A prisão do banqueiro, dono do BTG Pactual, promete desdobramentos. O que de fato está acontecendo nas entranhas do sistema financeiro que levou à prisão uma estrela internacional de primeira grandeza? A resposta, sem dúvida, virá nos próximos capítulos da Lava Jato. Véus estão caindo, as sombras se dissipando. Que rostos poderão ser vistos com nitidez, agora que não existem mais intocáveis?
A grande novidade, nesse processo, é que o STF fez história ao autorizar a prisão do senador Delcídio. E tornou-se o legítimo poder no País. Comunicou uma imagem-identidade sólida, revelou-se a barreira de contenção contra a corrupção sistêmica. Além do Congresso, a ação do STF revela uma presidente inerte, sem tomar as posições que precisaria tomar. Dilma Rousseff precisa vir a público. Explicar o que está acontecendo. Afinal, Delcídio era líder do governo e a Petrobras sempre esteve sob a responsabilidade da presidente. Não é o simples afastamento do senador preso que irá fechar as graves feridas abertas.
Por fim, não é exagero dizer que o PT acabou. A futura candidatura de Lula à presidência da República também. É o que pior: o partido não mais representa a esquerda no país. Corrompeu-se no sentido de que não mais representa o papel que se propôs a cumprir, a transformação da sociedade. Perdeu-se nos labirintos da política pelo poder. Perdeu sua identidade. E não pela força conservadora - que se revela insípida, sem qualquer proposta efetiva -, mas, sim, pela própria inércia. O PT foi derrotado pelo PT. Não entendeu o país. Carece de visão teórica e, portanto, de prática transformadora. Seu ocaso começa com o mensalão e se consuma com a prisão de Delcídio, mais o não declarado alinhamento com Cunha. Não está á altura dos problemas do país.
Resta saber quais serão os próximos passos. A prisão de Eduardo Cunha? As reformas estruturais? Um novo pacto social? A reorganização da esquerda? Importante é que as mudanças estão ocorrendo no ambiente democrático. Se o STF passou à iniciativa, ocupando o centro do tabuleiro, é porque os outros dois poderes - executivo e legislativo - encolheram. Precisam renascer. E acompanhar os novos tempos. A preponderância de um poder republicano sobre os demais não pode durar muito tempo. Como ensina Montesquieu, os poderes precisam de equilíbrio e interdependência.
* Francisco Viana é doutor em Filosofia Política (PUC-SP) e consultor de comunicação organizacional.