Francisco Viana*
Foi uma atitude digna de O Globo desmentir um dos seus principais colunistas, Lauro Jardim, na primeira página. O jornal reconhece, na sua edição de domingo, dia 8, ser falsa a notícia divulgada como manchete de primeira página no dia 11 de outubro, “informando” que o lobista Fernando Baiano teria dado R$ 2 milhões para pagar contas de Lulinha, filho do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva. Reconhece que o nome de Lulinha não foi citado por Baiano, que apenas “disse que o também lobista e pecuarista José Carlos Bumlai é que pediu dinheiro alegando que seria para uma nora de Lula”. São coisas bastante diferentes, não?
Pergunta, como um colunista divulga uma notícia de tal envergadura sem apurar antes? Toda e qualquer denúncia deve ser devidamente apurada. Mas uma notícia de tal calibre e com tais e previsíveis repercussões precisam ser apuradas, checadas, verificadas. Sobretudo, nesse momento em que os demônios do conservadorismo estão à solta, bombardeando Lula sem qualquer clemência. O objetivo é claro: desmoralizar o ex-presidente com o propósito de destruir sua imagem-reputação-identidade.
Sendo assim, um jornalista que divulga notícias que desmoralizam o ex-presidente sem o devido cuidado de apurar sua realidade, erra duplamente. Erra porque faz o jogo conservador, erra porque mina o método jornalístico. E qual é o método? Apurar, ouvir os dois lados, ser cético. Sem método, o jornalismo se transforma em mera propaganda, em frontal desrespeito aos fatos. Isto porque a isenção jornalística ocorre de uma forma objetiva: ouvir os lados envolvidos, dando direito de defesa amplo àquele que é acusado. Ao admitir o erro, O Globo afirma sua credibilidade. O mesmo não se pode dizer do colunista.
Uma outra pergunta: qual será o desdobramento do histórico desmentido de O Globo? Será seguido por outros jornais, tvs, rádios e pelas mídias sociais? Haverá crescente responsabilidade nessa nobre – e essencial para a democracia – missão de informar? O vale tudo na mídia estaria conhecendo o seu ocaso? O tempo dará as respostas. Porém, é fácil verificar que há uma vasta dissonância entre aquilo que a chamada grande imprensa denuncia e as reações da sociedade. Atitudes como a de O Globo demonstram que o jornal se afasta de uma corrente que faz denúncias atreladas à posições políticas –que são legítimas quando não se cede à tentação de manipular – , não aos fatos.
A sociedade está aprendendo a separar o que é fato daquilo que é versão. Ou inverdade. Também, sente-se um crescente desprestígio das vozes conservadoras na mídia. Percebe-se facilmente que não têm bandeira, salvo a bandeira do impeachment da presidente Dilma Rousseff. E isto, fica cada vez mais claro, não é bandeira: é revanche pela derrota sofrida nas eleições. Percebe-se, igualmente, que a grande imprensa se afasta da sua missão de formar e informar à população, semeando a angústia, o medo, a instabilidade, em lugar de promover a estabilidade e a paz.
O Brasil precisa encontrar o equilíbrio democrático e lidar com os problemas com naturalidade, busca de soluções. Quanto menos conflito artificial, mais a sociedade irá florescer na liberdade. Nesse aspecto, a mídia tem inigualável contribuição a oferecer. Não é apenas o Governo que precisa inspirar confiança, mas a própria democracia. Não significa ausência de crítica, de denúncias e muito menos de liberdade. Significa tão somente levar à prática um antigo cânone do método jornalístico: apurar antes de divulgar, ouvir os dois lados, deixar, enfim, que o cidadão faça seu julgamento. Não publicar o que parece sensacional ou espetacular. Se não o faz por má fé, o faz por ingenuidade. A mídia brasileira está precisando de muita renovação e de uma revolução que a leve a discernir o novo rosto do pais. Domingo O Globo fez jornalismo. Admitiu aquilo que todos os que erram devem fazer. Dizer: errei.
* Francisco Viana é jornalista, consultor de comunicação e doutor em filosofia política (PUC-SP)