amazonO empregado pode utilizar rede social ou se pronunciar de alguma outra forma para defender a empresa em que trabalha, sem que a resposta tenha sido endossada pelo empregador? Essa é uma boa polêmica. Ela veio à tona, quando em agosto último, o New York Times publicou um artigo “Inside Amazon: Wrestling Big Ideas in a Bruising Workplace” (Por dentro da Amazon: Grandes ideias de luta em um conturbado ambiente de trabalho) bastante polêmico. Nele, o NYT revela práticas pouco ortodoxas da gigante do comércio eletrônico Amazon, no trato com empregados.

Nesse artigo, o NYT questiona os métodos de fidelização e treinamento da Amazon, citando vários episódios e com relatos do sistema draconiano e até certo ponto desumano no recrutamento de pessoal. O artigo esmiúça o estilo centralizador, exigente e perfeccionista do CEO da Amazon, Jeff Bezzos, e sua obsessão por continuar expandindo o gigante do varejo eletrônico.

“Na Amazon, os trabalhadores são incentivados a cotejar as ideias de uns e de outros, nas reuniões. Eles trabalham longas e tardias jornadas (emails chegam após a meia noite, seguido por mensagens de texto perguntando por que eles não foram respondidos), e são mantidos dentro de padrões dos quais a empresa se orgulha, por serem "excessivamente elevados", na versão dos jornalistas Jody Kantor e David Streitfeld, autores do artigo.

"Sistemas de comunicação interna estimulam colegas sobre como enviar um feedback em segredo para o chefe dos outros. Funcionários dizem que esse instrumento é frequentemente usado para sabotar outros. (A ferramenta oferece textos de amostra, incluindo esta: "Eu me senti preocupado com sua inflexibilidade e abertamente reclamando sobre tarefas menores"), diz o artigo do New York Times.

A reportagem do jornal expõe problemas que muitas vezes são denunciados em empresas com uma cultura corporativa que estimula a competição no seu mais alto nível, principalmente aquelas gigantes que estão hoje disputando mercado a qualquer preço. Os empregados que não conseguem acompanhar o ritmo da empresa, os "perdedores", são "rifados" no fim do ano, numa espécie de "limpeza", prática que não seria só da Amazon. Outros denunciam que sofriam de câncer, abortos espontâneos ou outras crises e teriam sido julgados de forma injusta, pelo momento que atravessavam, e a empresa não lhes deu tempo de se recuperar. Tudo isso na versão do NYT.

O artigo teve relativa repercussão, como tantos outros que questionam culturas internas de empresas que querem sempre estar no topo do mercado. Mas não foi o enredo do artigo do NYT que mereceu o o maior destaque.

O curioso no episódio é que no dia seguinte, “enquanto especialistas em relações públicas e o próprio CEO estavam trabalhando em uma resposta formal à cobertura negativa do NYT, um empregado da Amazon, por sua conta e risco, supostamente, decidiu publicar uma consistente opinião pessoal, antes de dar à empresa uma chance de reagir. Foi, afinal, apenas uma opinião pessoal, mas acontece que ao fazê-lo, ele assumiu a liderança na resposta da Amazon: um artigo de opinião tempestivo e bem escrito que foi citado e pegou muito rapidamente, pela grande cobertura da mídia nacional e internacional (com o efeito insanamente multiplicado pelas redes sociais). Ou seja, não havia um pronunciamento formal da empresa e quem saiu em defesa da Amazon foi um empregado”, segundo comentário de Irina Efremova, no site PRNewser,  publicado no artigo "Amazon Case Marks an Employee Takeover of the Communications Machine".

O memorando oficial da empresa saiu no dia seguinte e fez, de fato, link para a peça do empregado. O CEO, Jeff Bezos, incentivou outros funcionários para lerem o post do colega. Naturalmente, porque o conteúdo estava em linha e agradava o "board" da empresa. 

O autor da façanha, Nick Ciubotariu, gerente na área de infraestrutura e pesquisa da Amazon, ficou surpreso com a repercussão de sua reação. Ele utilizou a página no Linkedin para criticar a reportagem do New York Times e defender a empresa, sem ter combinado com os chefes imediatos, a direção da empresa ou a assessoria de comunicação. Pelo menos na versão da imprensa.

Frank Strong, em artigo postado no site Crisis Commons, comentou a atitude e a reação subsequente do empregado, um fato raro no mundo corporativo. É muito mais comum as empresas restringirem manifestações de empregados, principalmente porque temem a repercussão de suas opiniões em época de crise.

“Infelizmente, muitos comunicadores corporativos, continuam a desempenhar um papel como o viés autoritário, policiando as atividades online. É um esforço na futilidade, e talvez até mesmo com efeitos adversos. Em vez de tentar impedir tal atividade, um melhor investimento de tempo seria orientar e concentrar esses esforços", diz o articulista.

“Dada a oportunidade, eu acredito que a maioria dos empregados vai agir de forma responsável. Há um grande risco em dar uma opinião. Imagine a situação de risco pessoal do Sr. Ciubotariu que correu em publicar esse post - e sua surpresa ao ver alto executivo da empresa incluir um link do seu post em um email enviado para todos os empregados.

“Plataformas como o LinkedIn nivelaram o campo de jogo, permitindo a qualquer pessoa com um teclado e um acesso à Internet a oportunidade de publicar as suas próprias opiniões. É uma das formas primárias, de como a comunicação de crise, a PR e, sem dúvida, o marketing estão mudando. Mas tudo isso requer iniciativa. E foi o que o Sr. Ciubotariu teve. Mas será que as empresas estimulam essas iniciativas ou contribuem mais para podar os voos solo dos empregados?"

No artigo citado, o autor diz que “iniciativa” – que significa ação na ausência de ordens - é uma característica incrivelmente desafiadora para incutir na cultura organizacional. Para a Amazon, a iniciativa foi um oportuno pacote que demonstrou uma cultura corporativa forte e uma sensação de pertencimento do empregado, que saiu em defesa da empresa, aparentemente sem qualquer vínculo com a cúpula da corporação, no que poderia ter sido, dias antes, uma resposta oficial, foi controlada, aprovada e publicada”. É um caso raro na área de PR.

O mais comum é o empregado se alinhar com a comunicação para dar uma versão oficial. Não esquecer que a opinião de um executivo, não importa se ele está ou não dando opinião pessoal, nesse momento é fundamental para balizar o discurso de crise da organização. Por isso, ele terá que se inteirar rapidamente dos acontecimentos para poder enfrentar as câmeras. E mais: será muito difícil um empregado que resolveu assumir a defesa da empresa voltar atrás e se reposicionar. Porque aquela manifestação será levada em conta na avaliação da crise da empresa.

Para melhor entendimento do episódio, convém ler os vários artigos publicados dada a repercussão da reportagem do New York Times e seus desdobramentos. Há também uma história muito interessante de um empregado da cadeia americana Goodwill, na Flórida, que foi preso porque tomou a iniciativa de dar um desconto pequeno a um cliente, na hora que realizou a venda, sem ter se beneficiado pessoalmente do desconto.

Outros artigos publicados sobre o tema

Inside Amazon: Wrestling Big Ideas in a Bruising Workplace

An Amazonian’s response to “Inside Amazon: Wrestling Big Ideas in a Bruising Workplace”.

Crise Comms: Ninguém mais confiável do que um empregado

Amazon Case Marks an Employee Takeover of the Communications Machine

Andrew Anderson, Fla. teen, arrested for giving away discounted items at Goodwill

 

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