Francisco Viana*
Quem vai vencer a corrida presidencial só se saberá quando as urnas se abrirem, mas o grande perdedor da eleição é conhecido: o marketing político. Não que vá desaparecer, pois é parte do jogo democrático, mas, como forma ilusória de persuasão, deixará de ser preponderante.
As surpresas nas pesquisas da campanha demonstram. Nada do que foi previsto vem acontecendo. Pelo contrário, com o desastre aéreo que matou Eduardo Campos, emergiu um país diferente para o qual o marketing político sempre virou as costas, embora seja o país real. O espelho da persuasão foi, assim, invertido.
Na Grécia Antiga, a persuasão era vista como uma deusa sedutora que encantava os homens, fosse no que a sua arte contém de falso, de verdadeiro ou fosse capaz de promover a paz. Foi, sem dúvida, o embrião do marketing político graças à procura dos representantes da sociedade, à época, de imagem positiva, mesmo que nada nela existisse de concreto.
O marketing político, no Brasil, teve o condão de romper o lugar-comum do discurso tradicional, inovando na linguagem e na forma de seduzir o eleitor. Contudo, sempre careceu de conteúdo efetivo. Esteve sempre mais para a ficção do que para a realidade.
Em lugar de apresentar candidatos na forma de pessoas que erram e acertam, que têm dificuldades e graves impasses a resolver, optou por candidatos de fantasia, vivendo num país de fantasia. Anulou-se a espontaneidade, abriram-se as cortinas para o lado falso da persuasão.
O fenômeno, a rigor começa no Estado Novo, com a propaganda e a censura varguista, e ganhou papel hegemônico na democratização que se segue à Constituição de 1988. A palavra de ordem era criar um mundo artificial, sem conexão com a vida das pessoas, isto é, com a política, a habilidade de antecipar o futuro, de trazer felicidade para o cidadão.
Em torno do marketing político vicejam inúmeras lendas. Por exemplo, seus profissionais são pagos a peso de ouro, fazem pesquisas para que os candidatos falem o que a sociedade quer ouvir (não o que os candidatos vão fazer), desenvolvem o mito de plataformas eleitorais perfeitas, apresentadas por pessoas que tudo sabem, nunca erram. Há, também, outras questões mais obscuras, tal como o caixa 2, cuja caixa-preta, mais dia menos dia, será aberta. Erram na teoria e também na prática.
O que dizia a teoria? Que a sociedade iria caminhar continuamente para o desenvolvimento e as massas eram controláveis, manipuláveis, facilmente iludidas pelo poder na televisão. Nada disso aconteceu. As mídias sociais, com imenso poder de desmistificação, entraram em cena, e o marketing político não percebeu. Ficou onde sempre esteve, estagnado no tempo de faz de conta.
Entre a Constituição e os dias atuais, houve fenômeno ainda mais dinâmico. A liberdade de expressão educou o cidadão. E ele, como diria Gilles Deleuze, aprendeu a diferenciar o que é repetição da realidade. Isto é, foi iludido uma, duas vezes. Na terceira, trocou a ilusão pela indignação. Repetir, ensina Deleuze, nada mais significa que esconder o rosto em máscaras. A letra da repetição é o simulacro. Onde há liberdade, não há simulacro que resista.
Evidência de tal realidade foram as manifestações de mais de um ano atrás, a perda de prestígio dos políticos e a falta de força persuasiva da propaganda pela televisão. Também, passou-se a questionar a origem dos financiamentos das campanhas, e a legislação eleitoral, a cada eleição, torna-se mais severa. Comunicação passou a ser o que a sociedade entende, não mais o que o marketing político deseja impor. O marketing político nada disso viu. O tempo passou e ele ficou na janela olhando a vida mudar, passar, se recriar.
Faltou, portanto, a mediação dos fatos concretos para revelar qualidade, não simplesmente criá-la. Assim, a tarefa do marketing político moderno foi se desvirtuando, perdendo substância. Em larga medida, não se pode culpar apenas os profissionais. Os candidatos nunca deixaram de ter consciência da realidade em que estavam envolvidos. Fosse diferente, teriam reagido, criticado o marketing, fazendo-o mudar. Agora, tudo está acontecendo por imposição da realidade. É a velha lição aristotélica: o remédio da mudança pode ser doce ou amargo. No caso, o remédio amargo torna-se inescapável.
Jornalista, é e mestre em filosofia política ( PUC-SP).
Este artigo foi publicado originalmente no jornal Correio Braziliense, 12/09/14. Publicado com autorização do autor.