acidente coreiaTer planos de crise apropriados aumenta imensamente as chances de uma organização se sair bem quando tiver um problema. Enquanto nós estamos vendo um aumento significativo no número de organizações que têm planos de gestão de crises, a grande maioria desses planos ainda são lamentavelmente inadequados.

Em uma entrevista recente para o site NFIB.com (Protecting the future of small business), Adam Wren perguntou ao especialista americano Jonathan Bernstein, "o que exatamente deveria ser coberto pelos planos de crise?" Ele respondeu:

"Tenha planos de backup para cada situação previsível que poderia atingir a sua organização".  Adam Wren abordou no artigo How to survive 4 common small business crisis" pelo menos quatro grandes recomendações aos pequenos negócios, desde as alegações sobre manipulação de preços a um surto de E. coli em um restaurante local, passando por desastres naturais ou crises envolvendo problemas com clientes. Para Bernstein, o empresário "Não pode enfiar a cabeça na areia, no que diz respeito à preparação para crises”, e fingir que com ele não irá acontecer.

Alguém tem dúvidas de que a empresa proprietária do Ferry Boat Sewol, que viajava de Incheon para um resort na Ilha de Jejun, na Coreia do Sul, na semana passada, com 476 pessoas a bordo, tinha feito pelo menos reuniões para discutir possibilidades de crises? Será que a tripulação daquele navio nunca passou por treinamentos de situações de crise, simulando pane, assalto, incêndio, explosão, atentado terrorista, até o mais grave acidente que poderia acontecer com uma embarcação de transporte no mar, o naufrágio?

E por que, conforme já se depreende das primeiras informações, a tripulação cometeu tantos erros que acabaram sendo em grande parte responsáveis pela morte de quase 300 pessoas? As autoridades da Coreia do Norte estão investigando o acidente, que até esta segunda registrava 113 mortes e 190 desaparecidos, entre eles 339 adolescentes, crianças e professores de uma escola no noroeste do país.

coreia dorAs primeiras avaliações apontam para uma cadeia de erros: o Ferry Boat era dirigido por uma oficial de 25 anos, sem experiência em navegação de longo curso. Onde estava o comandante? Este e parte da tripulação saíram do barco, enquanto ele afundava com quase 300 pessoas ainda no seu interior; houve ordens da tripulação para os passageiros permanecerem a bordo, quando tudo indicava para eles procurarem a saída. O resultado foi que a maioria dos estudantes, inexperientes, obedeceram a ordem e acabaram presos no interior do navio, que emborcou e afundou no máximo em duas horas.

Foram erros primários, semelhanntes aos acontecidos há dois anos, no naufrágio do navio de cruzeiro Costa Concordia, no litoral de uma ilha italiana. A diferença para este acidente e aquele é que o Costa Concordia naufragou muito próximo à costa, possibilitando o resgate, ainda que dramático e sem comando, de quatro mil pessoas.

Quantos planos preciso ter?

Dada a diversificação das crises corporativas, como conciliar planos com  a diversidade de ameaças que hoje pairam sobre os negócios? Fica difícil uma empresa ter plano para tudo que possa acontecer de negativo. Para Jonathan Bernstein, “enquanto você não pode necessariamente ter um plano específico para cada crise, que possa atingir sua organização, você pode (e deve) criar planos abrangentes para cobrir as categorias de crise que você poderia esperar encontrar.”

“As diversas categorias e crises podem incluir desastres naturais, violência no trabalho, má conduta de funcionários, gestão de escândalo, violência na comunidade, roubo ou desvios de conduta, crime cibernético, as crises rotineiras do próprio negócio (naufrágio, no caso de transporte marítimo) e assim por diante. Obviamente estes irão variar muito dependendo do tipo de organização, localização, clientela e muitos, muitos outros fatores.

"Por isso, está na hora de você até sentar com a diretoria para realmente debater sobre os vários perigos ou ameaças que poderiam aparecer no seu caminho. No final do dia, você terá criado um sistema de resposta rápida e eficaz para qualquer crise.”

“Não é algo agradável nem divertido pensar sobre todas as terríveis coisas que poderiam acontecer no seu negócio, mas, acredite, você vai se sentir melhor, e se recuperar mais rápido, se você tem planos adequados e testados antes de uma crise atingi-lo”, diz Bernstein.

Admitindo que a tripulação do Ferry Boat coreano tenha feito simulações ou pelo menos tido alguma instrução sobre eventuais problemas, por que o acidente foi um desastre completo sob o ponto de vista da gestão da crise, a ponto de a presidente do país chamar os tripulantes, que abandonaram os estudantes à próprio sorte, de assassinos?

As empresas, em geral, desdenham de planos de crise. No caso, naufrágio é um acidente totalmente plausível num navio de transporte de passageiros, como pode ser um acidente grave numa empresa aérea. Outro fator que contribui para um certo relaxamento nos planos de crise é a autossuficiência ou arrogância das empresas. Elas acreditam pela tradição, força da marca, longo tempo sem crises e domínio completo do ramo de negócio que nada negativo e grave acontecerá. Aí talvez se situe o maior número de erros das empresas. Acabam surpreendidas, porque além de não se prepararem para a crise, desdenham sua extensão.

São exemplos desse “desprezo” pela possibilidade de um acidente grave a explosão na Usina de Fukushima, no Japão, em 2011; a explosão, seguida de vazamento, de uma plataforma da British Petroleum, no Golfo do México, na costa americana, em 2010 e, no Brasil, o lamentável e terrível incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, Rio G.do Sul, em 2013, que deixou 242 mortos, a maioria jovens.

Impressiona também que após tantos alertas sobre as ameaças de crises e os exemplos diários com empresas relapsas, que não respeitam o consumidor e periodicamente estão envolvidas em crises, que as organizações não se preocupem com um tema grave que quase sempre representa séria ameaça ao negócio e à sobrevivência da organização. Qual o futuro da empresa proprietária do Sewol, na Coreia do Norte? Quem nos próximos anos confiará nessa empresa, após ser responsável pela maior tragédia do país após a Guerra da década de 1950?

A crise mais grave

Um exercício que temos recomendado, citado em algumas publicações de Crisis Management, inclusive no livro Gestão de Crises e Comunicação – O que gestores e profissionais de comunicação precisam saber para enfrentar crises corporativas - é a diretoria ou o comitê de crises periodicamente aplicar um questionário a determinados grupos ou áreas da empresa, com as seguintes perguntas: cite três crises graves que poderíamos enfrentar. Imagine o pior cenário. Qual dessas crises estamos preparados para enfrentar? E por que? Quais dessas crises não estamos preparados para enfrentar. E por que? Ter medo de imaginar os piores cenários pode demonstrar uma falha grave em lidar com planos de crise.

Outros artigos sobre o tema

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Naufrágio na Coreia repete erros do Costa Concordia

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