Relações incestuosas entre governantes, políticos, empresas privadas e públicas transformam o país num grande condomínio, em que os poderosos, que ocupam o poder a cada quatro anos, têm o controle absoluto das contas públicas. Aproveitam-se da condição de donos da chave do cofre para abrir dutos suspeitos por onde escoa o dinheiro público para financiar campanhas ou incrementar patrimônio privado.
Arruda e seu governo é o capítulo atual e mais escancarado de uma infeliz saga que pontua a história do Brasil e de outros países, principalmente, da América Latina. A permissividade com o dinheiro público acaba permeando toda a máquina, do tubarão ao bagrinho. O cargo público ou o mandato se transformam numa permanente troca de favores ilícitos, quando ninguém vê impedimento ético tanto em pedir uma passagem de graça ao fornecedor, quanto compensações milionárias a empreiteiras e empresários.
A crise de ética e vergonha, para usar uma palavra que todos entendem, contaminou a máquina do poder, a ponto de hoje passar a idéia de que para governar, é necessário transgredir. Corre-se o risco de lamentavelmente admitir que ser honesto acaba sendo um estorvo para o governante seguir adiante. Ou seja, no imaginário das pessoas, o homem público em cargo de confiança, se não prevaricou, estaria em vias de escorregar, cooptado pelo sistema. Nada mais pernicioso para a cultura de um país.
Muda-se o governo, não mudam os costumes. Pelo contrário, alguns aprimoram o modus operandi, como aconteceu em Brasília. Pessoas com passado nada ilibado, enroladas em denúncias, mas eficientes na captação de dinheiro e nas relações promíscuas com empresários, acabam se perpetuando no poder, assumem cargos de confiança, mais pela capacidade de agir nas sombras do que pela eficiência administrativa.
Afinal, qual é a genética ou DNA da corrupção, que iguala empresários, políticos, funcionários públicos e os transforma em agentes corruptos, com eficientes máquinas aparelhadas para ter o controle absoluto de todos os cargos e atalhos que levam até o caixa. Que valores movem essas pessoas?
Não adianta culpar a política de interiorização do Brasil, que levou à construção de Brasília, pelas mazelas dos políticos que povoam o noticiário nacional. Juscelino não tem nada a ver com isso. Colocar a culpa nas costas da Capital é apenas uma reação saudosista de viúvas da antiga capital no Rio de Janeiro e da desfaçatez de personagens que não nasceram em Brasília. Eles chegaram lá com os vícios de seus estados de origem. Culpar Brasília e sua população pelas falcatruas de quadrilhas instaladas nos nichos públicos, é querer simplificar as coisas. Como se a manutenção da capital no Rio, pudesse transformar corruptos e corruptores em vestais.
O Brasil está precisando de um choque de honestidade. Não é possível todos os dias descobrir-se uma quadrilha que inventa alguma forma original de se apossar do dinheiro público, como aconteceu agora com uma gang que desviava auxílio-creche na Câmara dos Deputados. Só que a iniciativa deveria partir dos detentores do poder. Mas eles não têm nenhuma pressa de mexer nesse vespeiro. Enquanto isso, prepare-se. Até 30 de abril todos devemos prestar contas ao Leão. Afinal, alguém tem que garantir o saldo dessa conta sem limites que, infelizmente, políticos e governantes inescrupulosos tentam transformar em patrimônio privado.