Incendio em Sao PauloComo pode acontecer uma tragédia como a ocorrida no edifício Wilton Paes de Almeida, na região do Largo do Paissandu, área central de São Paulo? Para não ficarmos limitados ao nosso complexo histórico de “vira-lata”, tragédia semelhante ocorreu em Londres em junho de 2017. O edifício Grenfell Tower, de 24 andares, usado por pessoas de baixa renda, maioria imigrantes, no centro de Londres, pegou fogo e 79 pessoas morreram. Não dá para dizer que a legislação britânica é leniente para prevenções de incêndio, algo raro na capital.  E nem que fraqueja na política habitacional, aliás rigorosíssima, a ponto de imigrantes preferirem morar fora de Londres, nas muitas cidades que rodeiam a capital, pelo preço e a legislação.

Como sempre acontece em tragédias semelhantes, por trás de cada uma, um erro, um cochilo implacável e imperdoável. Uma crise humanitária, mas também uma crise política, como se encarou na Grã-Bretanha. O prédio de Londres era revestido por material altamente inflamável. Os moradores sabiam que o prédio era perigoso e alertaram as autoridades. E por que ninguém tomou providência? Após as tragédias, como certamente vai acontecer agora no Brasil, por alguns dias o tema vira pauta da mídia e de inúmeras reuniões e entrevistas oficiais. Passado algum tempo, esfriado o tema na mídia, tudo é esquecido, até a próxima tragédia. Não é muito diferente em outros países.

A burocracia estatal administra por espasmos. Um acidente aqui, uma tragédia ali, um assassinato midiático, como o da vereadora Marielle Franco no Rio, e toda a mídia, seguida por políticos aproveitadores e governantes pressionados pela sociedade e pela eleição, saem correndo para dar explicações e soluções improvisadas.

Se aconteceu em Londres, como já aconteceu em Paris, como não iria acontecer aqui? Nós nos acostumamos a ver notícia de incêndio em amontoados de barracos, principalmente em S. Paulo e Rio de Janeiro. A tragédia é a mesma, quando se trata de pessoas que, sem terem onde morar, preferem ficar no centro da cidade, mais perto das oportunidades de emprego ou ocupação informal. Não querem morar na periferia, até porque nem sempre têm dinheiro para o transporte. Mas como explicar que relatórios divulgados pela mídia, assinados por um engenheiro da Prefeitura de S. Paulo, diziam que o prédio que desabou não tinha problemas estruturais e por isso não foi desocupado?

O incêndio e desabamento em S. Paulo é uma tragédia anunciada, disseram muitos especialistas. Existem mais de 70 prédios invadidos apenas na Capital, calcula a Prefeitura. Destes, 13 são tombados pelo Patrimônio Histórico. De certo modo, tanto os movimentos sociais que intermediam e coordenam essas invasões, quanto os governos, fingem que o problema não existe ou fecham os olhos para as ocupações ilegais, os últimos por incompetência ou omissão mesmo; os primeiros por convicções nem sempre humanas, mas políticas e, por que não dizer, financeiras, como aparece agora nas acusações que os moradores do prédio fazem às lideranças do chamado Movimento de Luta Social por Moradia-MLSM. “O que eu faço é abrir prédios”, diz um dos cabeças do movimento, como se fosse o anjo da guarda dos moradores, pressionado por acusações de que embolsam o dinheiro dos pobres que ali residem e na hora do aperto somem, como aconteceu com alguns deles nesse episódio.

 

edificio que desabou em SP

A polêmica sobre quem é mais culpado por essa tragédia - se os governos que se omitem ou os movimentos populares (são 162 somente em S. Paulo), com políticas que aparentam ser de "anjos da guarda", não levará a lugar nenhum. Até porque agora os ocupantes que escaparam querem saber para onde eles irão, não podendo ficar nas ruas. Mas também não querem ir para longe do centro, onde muitos ainda conseguem biscates para sobreviver.

Reportagem do jornal Hoje, da Rede Globo, mostrou documentos, como relatórios e memorandos, que mostram uma batalha de informações desencontradas entre governo federal, o proprietário do imóvel e a Prefeitura. Os invasores nem imaginam como o destino deles é administrado.

O que emerge dessa tragédia é a triste realidade do inchamento das grandes cidades, principalmente as capitais, onde as oportunidades de emprego são melhores. E um grupo organizado de espertos que quer tirar proveito político dessas ocupações, explorando quem precisa achar um lugar para acampar, o que para eles é morar. Os "movimentos", como o governo de modo geral, estão se lixando para fiscalizar se esses prédios são seguros ou significam verdadeiras ratoeiras humanas. A maior demonstração foi constatada pela imprensa: os líderes do movimento, assíduos frequentadores para cobrar os aluguéis, sumiram após a catástrofe. Seria muito importante para eles virem a público dizerem o que realmente faziam pelos invasores. Era um ramo de negócio desses espertos? Ou os invasores se viravam sozinhos, como parece ser a realidade do edifício que incendiou? O principal líder foi intimado a depor e negou que recebesse pagamento. Documentos apreendidos dizem o contrário.

Grenfell Tower London incendioO incêndio foi, infelizmente, o trágico epílogo das condições em que vivem essas famílias, sem qualquer ajuda do governo e improvisando gambiarras e toscas instalações elétricas, como a que provocou o incêndio, segundo apurou a perícia, porque jogados ali, não têm mais apoio de ninguém, nem dos espertalhões. E ainda temos que ouvir entrevistas e comentários de viés esquerdista, como a do candidato Guilherme Boulos, com o respaldo do jornalista Kennedy Alencar, dizerem que “não se deve criminalizar os movimentos”, que fazem a parte deles. O governo seria o culpado. Se formos analisar quem está fazendo as coisas certas, a resposta é ninguém.

A permissividade com que as autoridades deixam se formar favelas, com barracos de madeira, altamente inflamáveis, em terrenos baldios; ou invasões a prédios abandonados, junto com a exploração de um bando de espertos, interessados em se cacifarem politicamente, é que leva a essas tragédias. Nada que o Brasil não conheça. Quem não lembra, para citar apenas uma, o que aconteceu em 2010, em Niterói-RJ. O deslizamento no antigo lixão, aglomerado Morro do Bumba, quando desapareceram 267 pessoas, sendo apenas 48 corpos encontrados. Uma crise que acumula anos de leniência, não importa quem esteja no governo, e, pior ainda, de desrespeito à vida. O que aconteceu em São Paulo na madrugada de 1º de maio é a crônica da crise anunciada, crises essas que todos os governos têm extrema dificuldade de gerenciar. Até a próxima.

Fotos: Incêndio e desabamento do Edifício Wilton Paes de Almeida, em S. Paulo; Como era o edifício de S. Paulo, antes da tragédia; Incêndio na Grenfell Tower, Londres.

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