A Hydro Alunorte, empresa controlada pelo governo norueguês e dona da maior refinaria de óxido de alumínio do mundo, localizada em Barcarena, no Pará, a 50 km da capital Belém, está sendo investigada por crimes ambientais que comprometem o meio ambiente e a saúde dos moradores de comunidades locais.
A empresa, que usa bauxita para produção de alumina (ou óxido de alumínio), é acusada de ter contaminado áreas verdes e rios do entorno, com rejeitos formados de bauxita e outros elementos tóxicos, como chumbo, que teriam transbordado após fortes chuvas ocorridas na região entre os dias 16 e 17 de fevereiro último. Além disso, a empresa é questionada sobre a descoberta de um duto clandestino que despejava rejeitos no meio ambiente sem o devido tratamento.
A crise da mineradora norueguesa, que teve ampla repercussão a partir de fevereiro deste ano, decorre da receita recorrente de problemas graves que envolvem mineradoras: degradação do solo, poluição dos mananciais hídricos, combinados com a pressão por mais produção e a ganância por lucro, que leva ao relaxamento no controle de depósitos de rejeitos, sem falar na falta de transparência na hora de prestar contas, principalmente quando há acidentes. Mais ou menos o que aconteceu há pouco mais de dois anos com a mineradora Samarco, em Mariana, este o maior acidente ecológico do Brasil, até agora com inúmeras pendências para poder voltar a operar.
Atividade suspensa
Com a Hydro Alunorte não tem sido diferente. A empresa foi acusada de poluir rios da Amazônia. Os moradores denunciaram a existência de dutos vazando produtos tóxicos e a empresa fingiu desconhecer. Em 27 de fevereiro, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS) do Pará notificou a refinaria de alumina Hydro Alunorte, de propriedade da empresa de alumínio norueguesa Norsk Hydro ASA, de que teria de reduzir sua produção de alumina calcinada em 50%.
A decisão das autoridades foi tomada devido a preocupações com a possível contaminação do meio ambiente por rejeitos de bauxita da companhia. A Alunorte informou, por meio de Nota, que havia ainda uma falta de clareza sobre quais medidas precisariam ser tomadas para que a empresa retome as operações normais na unidade, que transforma bauxita em alumina, que depois vira alumínio em fundições.
Na última 5ª feira, 5 de março, a Alunorte moveu uma ação contra o MP para poder retomar as atividades, suspensas pela SEMAS, após negativas da empresa em reconhecer que poluía rios da região. A suspensão ocorreu em fevereiro. Após as denúncias da população local e das análises do Instituto Evandro Chagas-IEC, a empresa terminou por admitir o despejo de efluentes no meio ambiente, em Barcarena, por acidente e também de forma intencional, por canais não licenciados.
Até o momento, no entanto, a empresa não publicou em detalhes quais os elementos e as quantidades despejadas. A Alunorte vem enfatizando que os efluentes despejados eram água de chuva não tratada e que não esteve em contato com as áreas de depósito de resíduos de bauxita. Também informou que a água de chuva da área da refinaria poderia conter poeira de bauxita e vestígios de soda cáustica. Ou seja, uma comunicação confusa e pouco transparente com a população, diretamente interessada no assunto.
História mal explicada
Cinco dias depois das denúncias da população, laudo do IEC confirmou aquilo que a mídia e os moradores denunciavam. Não foi a empresa que se acusou. Em Murucupi, foi encontrado o local do vazamento em uma tubulação que pertencia à Hydro Alunorte. Ela despejava os rejeitos diretamente no rio. Difícil admitir que a empresa não soubesse dessa irregularidade. No mínimo, se não sabia, foi omissa. A empresa, ainda que tardiamente, acabou admitindo a falha. Três semanas depois, em 9 de março, foi encontrado outro canal com despejo irregular, dentro do sítio da Alunorte, em Barcarena. O MPF deu 48 horas para o local ser lacrado.
Em meados de março, portanto um mês após as primeiras denúncias, a empresa norueguesa assumiu que problemas internos causaram o despejo de materiais tóxicos na cidade de Barcarena. Segundo Sérgio Abranches, comentarista de Ecopolítica da CBN, "O caso serve para reforçar que, ao contrário do que defendem alguns projetos políticos, não pode haver maior flexibilização nas concessões para mineração no país."
O passado me condena
Os deslizes da Alunorte não são recentes. Desde 2006, o Ministério Público Federal exige que a Albras e a Hydro Alunorte, ao lado de outras quatro mineradoras do polo industrial de Barcarena, forneçam “em caráter emergencial” dois litros diários de água potável por morador e “indenizem os danos ambientais à população afetada pela contaminação”. A empresa é reincidente. Em 2009, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) multou a mineradora pelo mesmo motivo de que vem sendo acusada atualmente: vazamento de rejeitos. As multas somam 17,1 milhões de reais e não foram pagas até hoje. A empresa recorreu e informou que acompanha os processos.
Quando o IEC confirmou, em fevereiro último a contaminação que a empresa provocava por vazamento das barragens de rejeitos de bauxita, a mineradora em nota informou que iria analisar o laudo para se pronunciar sobre o assunto. Fotos feitas no município comprovaram alteração na cor da água do rio, que seria a lama vermelha, rejeitada na operação da fábrica (bauxita e soda cáustica).
Segundo o Ibama, em 2009, o vazamento colocou a população local em risco e gerou mortandade de peixes e destruição significativa da biodiversidade. O órgão aplicou três autos de infração à empresa Alumia do Norte do Brasil (Alunorte) em decorrência de poluição pelo lançamento de bauxita no rio Murucupi.
A Procuradoria Geral da República afirma que emissões da Alunorte, em conjunto com as demais empresas da região, seriam responsáveis pela contaminação da área. Ou seja, o Ibama diz que poluem, elas sabem que o fazem, mas negam. "O histórico de acidentes ambientais em Barcarena é impressionante, uma média de um por ano", disse à BBC Brasil o procurador da República Bruno Valente, que assina uma ação civil pública movida em 2016. O que impressiona neste caso é a resistência da empresa em negar a contaminação, confrontando os laudos técnicos. O simples fato de levantar uma suspeição sobre sua atividade, por si só perigosa para o meio ambiente, representa uma grave ameaça à sua reputação.
A prefeitura de Barcarena informou ainda que está monitorando a área da empresa 24 horas por dia, por meio do trabalho de técnicos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, e que vai elaborar um plano de retirada das famílias das comunidades, caso haja o transbordamento das bacias.
Irregularidades em série
Devido às preocupações, as autoridades tomaram várias medidas contra a refinaria, incluindo ordens para cortar a produção de alumina e suspender as operações em um de seus depósitos de resíduos de bauxita.
"Planos de contingência estão sendo implementados e a Alunorte está fazendo todo o possível para reduzir o potencial efeito negativo sobre clientes e fornecedores", disse a empresa na nota ao mercado. A Hydro afirmou ainda que está tomando e avaliando uma série de ações atenuantes possíveis para minimizar o efeito negativo para seus clientes.
A empresa informou à agência Reuters que poderia atender normalmente seus clientes por mais duas ou três semanas. Depois disso, caso os embargos permaneçam, poderia ter que buscar fontes adicionais de alumina de fontes externas.
A Hydro é a maior empresa de alumínio da América do Sul depois de adquirir os ativos de alumínio da mineradora brasileira Vale, no Estado do Pará, em 2011. A Alunorte emprega cerca de 2 mil pessoas e tem uma capacidade nominal de produção anual de 6,3 milhões de toneladas. A Hydro detém 92,1% da empresa.
O que disse a empresa
Em 28 de feveriro, a Hydro divulgou informação na página da Internet. “Planos de contingência serão implementados para reduzir o potencial efeito negativo sobre os clientes. Estamos fazendo o máximo para limitar o impacto desta situação desafiadora para nossos empregados, nossos clientes e para as comunidades que nos rodeiam", diz o presidente e CEO Svein Richard Brandtzæg.
“Embora ainda seja muito cedo para avaliar a dimensão e o impacto do corte de produção, a redução poderá vir a ter consequências financeiras e operacionais significativas para a empresa.
“A razão das medidas tomadas pela SEMAS foi o não cumprimento de uma determinação da SEMAS, em 23/02/18, de reduzir os níveis das bacias do depósito de resíduos sólidos DRS1 na Hydro Alunorte em um metro de borda até o dia 26/02. Ao utilizar bombas adicionais e aumentar a capacidade de tratamento de águas, o nível de um metro exigido foi alcançado no dia 27/02.”
Atualização em 10/04/18
Hydro recua e agora nega contaminação de área no PA
Em 10 abril, o jornal "O Estado de S. Paulo" divulgou a seguinte notícia:
A contaminação do solo e de águas na região de Barcarena, no Pará, se transformou em uma guerra de informações. Depois de reconhecer publicamente que sua fábrica de alumínio Hydro Alunorte, no Brasil., derramou água sem tratamento no Rio Pará, o maior da região, o grupo norueguês Norsk Hydro informou ontem que estudos contratados pela empresa "confirmam que não existe indicação de contaminação proveniente da Alunorte, após chuvas". Ao divulgar os resultados dos estudos contratados da consultoria ambiental SGW Services, a empresa declarou que "os relatórios confirmam nossas declarações anteriores de que não houve transbordo das áreas dos depósitos de resíduos de bauxita". "Também não há indicação ou evidência de contaminação nas comunidades próximas da refinaria em consequência das fortes chuvas de fevereiro", informou o diretor executivo da empresa Svein Richard Branjdtzaeg, por meio de nota."
Registra o jornal paulista que essa informação "É exatamente o contrário do que Brandtzaeg havia dito no dia 19 de março". E o Instituto Evandro Chagas reagiu com ironia à nova informação da empresa: "O que a empresa chama de 'relatórios independentes' são pagos por ela mesma".
Deprende-se dessa última posição que a empresa ficou extremamente incomodada com a repercussão do vazamento no Brasil, e provavelmente no exterior, e agora se apoia nessa consultoria para tentar desconstruir uma versão que foi corroborada pela própria empresa. Do ponto de vista da comunicação de crise, há em toda esta crise uma sucessão de erros, a começar pela falta de transparência desde o início das acusações e suspeitas. Pesquisa nos EUA mostrou que 55% do público em geral acreditam que todas as empresas nas crises mentem. Escondem alguma coisa. O "case" da Alunorte está mostrando que ainda estamos longe de saber a verdade sobre esta crise. Por falhas graves de comunicação.
Em 9 de março, a empresa Hydro Alunorte foi condenada a pagar o valor de R$ 150 milhões, segundo determinação da 1ª Vara Cível e Empresarial da Comarca de Barcarena. A ação busca a reparação por danos causados ao meio ambiente pelos vazamentos de efluentes de minérios na área da refinaria, a partir do dia 17 de fevereiro de 2018.
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