Acontece, principalmente, em época de férias. É um golpe manjado, mas todos os anos milhares de brasileiros de boa fé acabam caindo no conto do vigário protagonizado por estelionatários, empresários de araque, que abrem empresas travestidas de agências de turismo para atrair e enganar turistas. Geralmente usam nomes em inglês, para impressionar.
O golpe aplicado pela empresa Trip & Fun em cerca de 6 mil pessoas, em S.Paulo, no início das férias de julho, é recorrente. Alunos, pais, turistas, casais em lua-de-mel pagaram prestações para realizar a viagem dos sonhos. Uns embarcariam para Cancún, no México; outros para os Estados Unidos, Disney; Bariloche, na Argentina, ou Florianópolis, Atibaia, Sauípe. Ao tentar embarcar em Guarulhos, na semana passada, não havia avião nem hotéis reservados.
A empresa primeiro tergiversou. Transferiu a viagem para o dia seguinte. Típico de quem não está cumprindo o contrato. Telefones não atendiam. Quando encontrados, empregados ou diretores davam desculpas esfarrapadas. A polícia de São Paulo abriu inquérito para investigar o caso como estelionato depois que um grupo de vítimas registrou um boletim de ocorrência. A viagem de 30 de junho foi cancelada e remarcada para o dia 2 de julho, mas também não ocorreu.
Algumas famílias pagaram entre 4 a 5 mil reais por viagem, a prestações, desde o ano passado. Não viajaram nem receberam o dinheiro de volta. E, pior. Não há perspectiva de receber, não importa o registro na polícia e o barulho na mídia. A empresa Trip & Fun desativou o site e fechou as três lojas de São Paulo. Diz que vai passar por uma reestruturação e deixou todo mundo a ver aviões de longe, apenas.
Essa é a típica crise prevista para a época de férias no Brasil. Empresários de araque montam empresas de fachada ou com pouco capital e entram num mercado que exige profissionalismo, lastro financeiro e uma grande dose de empreendedorismo e de experiência. Não é reduto para amadores. Ao primeiro soluço do dólar, acabam dando bolo. Ou nem isso. Sempre arrumam desculpas para sumir com o dinheiro das vítimas, porque são empresas feitas por aventureiros ou criminosos mesmo.
Apesar dos golpes se repetirem, há uma impressão generalizada de impunidade. Por isso estimula a repetição do delito todos os anos. A rigor, nada acontece. A mídia faz um barulho danado, coloca passageiros chorando nos aeroportos, viajantes frustrados, registro de boletim de ocorrência. Abav-Associação Brasileira das Agências de Viagem, Procon, Ministério Público, Ministério do Turismo e Embratur lamentam, anunciam processos, dão conselhos óbvios.
Mas esses empresários, no próximo ano, irão abrir empresas com outros nomes e continuarão dando o mesmo golpe em milhares de viajantes. O efeito para o turismo é deletério. Muitas dessas pessoas iriam fazer sua primeira viagem para o exterior. Imaginem a frustração e o desespero para pais que economizaram anos para propiciar a viagem de formatura dos filhos.
Aconteceu em Brasília em 2008, 2009 e 2010. O mesmo sócio de uma das empresas, a Impacto Turismo, deu golpe em 2008. No réveillon de 2009 repetiu a dose. Ele comandou excursões para Arraial d’Ajuda, na Bahia e os hotéis não estavam pagos, muito menos os ingressos para os shows, conforme contrato. Cerca de 400 pessoas embarcaram na furada e tiveram prejuízos. Um dos sócios tinha 33 processos na Justiça quando organizou a segunda excursão.
Poucos conseguiram recuperar parte do dinheiro aplicado. Acabam não devolvendo o valor, alegando não ter bens para suportar a dívida. E continuam impunes. Prontos para voltar em outro estado, com outro nome e dar novos golpes.
Como prevenir crises desse tipo? Para os usuários, principalmente do interior, só usar empresas registradas no Ministério do Turismo e na Embratur. Agências de turismo com tradição, nome forte na praça, de preferência indicada por alguém que já viajou. Confirmar a passagem de volta, antes de sair do Brasil. Isso é muito fácil na própria empresa aérea. Não confiar em guias que afirmam ter a passagem, hotéis e tudo garantido, inclusive ingressos para shows, parques de diversões ou outras atrações. Peça os comprovantes.
Se o turista não quiser transformar o sonho da viagem num pesadelo, verificar com cuidado, antes de fechar o pacote, se a empresa cumpriu os contratos anteriores e tem experiência em viagens para o país e para o exterior. Não contratar por causa do preço. Desconfiar sempre de preços muito baixos, fora da realidade do mercado. Fazer um rastreamento, antes da viagem, para saber tudo sobre a empresa contratada.
Mas existe uma forma mais garantida de viajar. Dá um pouco de trabalho, mas não há o risco de calote. Compre a passagem diretamente na empresa aérea. Você faz o seu pacote. E reserve os hotéis, ingressos para shows, tudo pela internet. Busque referências de hotéis e empresas aéreas com quem já viajou. Aprenda você mesmo a fazer seu pacote de viagem e fuja das armadilhas. (João José Forni)