Em apenas 15 dias, o mês de julho já está marcado como um dos mais violentos deste ano, por conta de atentados e tiroteios que não param de ocorrer. O mundo globalizado fracassou na tentativa de eliminar fronteiras, barreiras comerciais e imigratórias e transformar a aldeia global num lugar onde se possa conviver em paz. O progresso, as novas tecnologias não têm ajudado a tornar nossa vida mais segura. Os terroristas e lobos solitários resolveram se comunicar por meio da barbárie. Não poupam inocentes; muito menos as crianças. Não importa onde. Pode ser numa rua da França ou num mercado do Oriente Médio.
De Dallas, nos Estados Unidos, a Nice, na França. De Istambul, na Turquia, a Bagdá, no Iraque, o que se assiste é um recrudescimento da violência por motivos religiosos, conflitos raciais, brigas pelo poder ou por convicções extremistas, que não admitem o mundo da liberdade e das conquistas ocidentais. Esse fanatismo provocou cerca de 650 mortes desde o início do mês, nesses ataques, a ponto de hoje as pessoas não se sentirem seguras em nenhum lugar do mundo.
O terror banalizado por lobos solitários e suicidas
Em 3 de julho, um violento atentado assumido pelo Isis (o grupo terrorista que se autodenomina exército islâmico) matou pelo menos 250 pessoas, em Bagdá, no Iraque. Foi o maior atentado dos últimos anos num país acostumado a sofrer esse tipo de ataque, há pelo menos 15 anos. Começava aí o mês de carnificina em que se transformou julho de 2016. O ataque em Bagdá foi numa rua movimentada onde funcionava um mercado, frequentado por muitas mulheres e crianças. Esse atentado ocorreu apenas cinco dias depois que muito próximo dali, no aeroporto de Istambul, três terroristas cometeram um ataque suicida que deixou 42 mortos.
Em 7 de julho, quinta-feira, cinco policiais foram mortos em Dallas, vítimas de um franco-atirador, enquanto patrulhavam uma manifestação antiviolência. O ataque premeditado aos policiais americanos se sucedeu a uma onda de protestos ocorrida nos Estados Unidos, pela morte de dois negros, nos últimos dias. Eles foram presos, por crimes ou antecedentes, e mortos de forma injustificável e covarde pelos policiais. O fanático que atirou nos policiais, de certa forma, quis simbolizar uma reação como se fosse uma vingança pelos ataques feitos por policiais aos negros, nos Estados Unidos, nos últimos dias. Ele tinha passagens pela polícia, mas, segundo autoridades locais, não era monitorado como uma ameaça terrorista. Por isso, admitem, não se tratou de um ataque terrorista, mas de características racistas.
No dia 14, quinta-feira, o terror volta a atacar. Mais uma vez a França foi vítima de mais um atentado, o terceiro naquele país em 18 meses. Um fanático alugou um caminhão-baú e avançou por uma avenida na beira da praia, na cidade de Nice, às margens do Mediterrâneo, durante as comemorações da Tomada da Bastilha, atropelando centenas de pessoas. O resultado foi a morte, até agora, de 84 pessoas, sendo dez crianças e mais de 100 feridos, 50 pelo menos em estado grave e, entre esses, muitas crianças.
A forma covarde e inusitada do ataque poderia sugerir ser um atentado difícil ou impossível de ser previsto. Nem tanto. Especialistas em gestão de riscos, principalmente de ações antiterror, admitem que houve uma falha grave de segurança e dos serviços da inteligência francesa. A rua na beira da praia, Promenade des Anglais, estava lotada de pessoas, para assistir os fogos comemorativos do 14 de julho, data nacional da França, e estava interditada ao trânsito.
Como o motorista conseguiu furar a barreira policial com um caminhão e avançar em alta velocidade, ziguezagueando, atropelando centenas de pessoas? A cena de policiais correndo atrás do caminhão, por patética, é muito parecida com a dos colegas noruegueses, tentando chegar à Ilha de Utoia, próxima a Oslo, em 2011, quando um ativista de extrema-direita e fundamentalista cristão – recentemente condenado – ficou mais de uma hora atirando em jovens que participavam de um encontro partidário, matando 68 deles na Ilha, e mais oito no centro da cidade, este último grupo num atentado a bomba. A polícia norueguesa, a exemplo da francesa, foi surpreendida pelo ataque e foi incapaz de impedi-lo ou mitigá-lo com rapidez, até porque teve extrema dificuldade de atravessar um lago para chegar à ilha, onde ocorria o massacre.
Em Nice, o motorista do caminhão foi morto pelos policiais durante o ataque. Mas ele percorreu pelo menos 2 km, antes de ser morto. Ele é natural da Tunísia, mas tinha licença para trabalhar na França. Embora os terroristas do Isis tenham reinvindicado o ataque, não apareceram provas de que o motorista tivesse ligação direta com os fanáticos. Entretanto, a França considerou um ataque terrorista pela origem muçulmana do autor. Ele já tinha passagens pela polícia por violência, mas não era cadastrado como terrorista. Neste domingo apareceram indícios de que outras pessoas podem ter dado apoio ao suposto “lobo solitário”, que também utilizou armas no ataque.
Na última sexta-feira, dia 15, tentativa de golpe na Turquia deixou 290 mortos. Com a reação do governo, cerca de 6 mil pessoas foram presas, sendo 3 mil procuradores e magistrados, além de militares. A tentativa de golpe disseminou um clima de incerteza e terror na Turquia, até porque apesar do apoio popular ao governo, o fracasso do golpe acabou fortalecendo o autoritário presidente, que usa repressão violenta contra inimigos do governo, inclusive jornalistas. A Turquia vive em contínua ameaça de atentados, porque é aliada dos países que combate o chamado exército islâmico, o grupo terrorista que ocupa territórios na fronteira e está perdendo espaço nos últimos meses.
Neste domingo, em apenas 17 dias do mês, outro atentado a tiros nos Estados Unidos. Um tiroteio deixou três policiais mortos em Baton Rouge, capital do estado da Luisiana. Um suspeito foi morto e pelo menos seis policiais foram feridos. A emboscada armada contra os policiais foi na mesma cidade onde um negro foi morto na semana passada, após ser preso por policiais.
Como se vê, as formas de ataque variam de acordo com a oportunidade e a estratégia dos terroristas. É irônico ter acontecido o segundo mais letal ataque terrorista na França, em Nice, uma das cidades mais bem policiadas e vigiadas do país. Isso mostra que quanto você está treinado e preparado para um ataque terrorista importa menos hoje do que o local onde você está. Porque não existem mais limites para a ousadia, a covardia e a frieza desses grupos que coordenam os ataques.
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