gaza protestosA semana que passou poderia ter sido apagada do mapa da história. Não houve sequer um dia em que o mundo não tenha se deparado com uma crise grave, com impactos destruidores sobre a vida. Qual o bem mais precioso das pessoas, a não ser a vida? Ela foi desrespeitada, vilipendiada e banalizada nestes últimos dias. Do ataque insensato e estúpido a um avião civil, na Ucrânia, aos bombardeios desproporcionais de Israel à faixa de Gaza.

Após a queda do voo MH17, da Malaysia Airlines, na fronteira da Ucrânia com a Rússia, na quinta-feira passada, parece que nada poderia ser pior na semana. Mas o conflito no Oriente Médio mostrou que tudo pode ficar ainda pior. Chegamos ao fim de semana com mais de mil palestinos mortos, sendo 218 crianças, e 6.600 feridos, entre eles dezenas de crianças e mulheres; do lado de Israel,  45 soldados mortos e três civis. É a insensatez humana chegando ao limite, sob reuniões e conchavos políticos que não chegam a lugar algum.

Que culpa têm as crianças?

Gaza - olhar do desamparoEm todo o mundo disseminam-se protestos contra a ação de Israel, que parece desproporcional ao ataque que os palestinos insistem em manter, ao direcionar mísseis e tentar invadir o território, por túneis, para atentados, contra os israelenses.  Analistas internacionais, incluindo diplomatas, não tiram de Israel o direito de se defender. Mas quando bombardeios são feitos em direção a alvos que incluem escolas, hospitais, mesmo com toda a precisão cirúrgica, atingindo alvos civis, não há como deixar de entender que existe algo errado nesse conflito. Se não errado, do ponto de vista geopolítico, pelo menos do ponto de vista humanitário.

Longe de compreender e tentar explicar a gênese dessa crise histórica, a crua realidade é a morte que choca, principalmente por atingir centenas de crianças. Elas não têm nada a ver com a incompetência política da ONU, dos líderes políticos e dos radicais da faixa de Gaza em encontrarem uma solução que não seja a de colocar civis como alvos e um poderio militar que, por mais avançado tecnologicamente, usa a força para destruir.  Como disse um jornalista britânico, que já cobriu essa guerra: “"Este conflito é o equivalente político de LSD - distorcer os sentidos de todos aqueles que entram em contato com ele, e torná-los loucos".

Se Israel usa o poderia militar para se defender e intimidar, os palestinos do Hamas expõem seu povo a mais um massacre, ao continuar desafiando um poderio que, eles sabem, não poderão enfrentar.  É uma crise, aparentemente, sem fim, porque nenhum dos lados está realmente empenhado em terminá-la, na obsessão de seus próprios propósitos. Até porque ela alimenta os dois sistemas. Só resta, cada vez que a insensatez humana insiste na guerra como solução de suas desavenças, lembrar o desabafo do escritor argentino Ernesto Sábato: "Nós, adultos, de algo sempre somos culpados. Mas as crianças, que culpa podem ter as crianças?"

A bruxa está solta

Nem o mundo ainda tinha se recuperado do acidente da Malaysia Airlines, na Ucrânia, com a morte de 298 pessoas, na quarta-feira, 23, uma avião da TransAsia caiu em Taiwan, ao se aproximar do aeroporto, matando 48 pessoas. Dez pessoas sobreviveram, algumas em estado grave, no pior acidente do país em dez anos. Tudo leva a crer que o acidente foi provocado pelo mau tempo, na hora da aterrisagem do avião, que tentava um pouso de emergência.

No dia seguinte, quinta-feira, 24, um avião da Air Algérie, empresa controlada pela espanhola Swiftair, caiu no deserto do Saara, sul do Mali, matando 116 pessoas. No avião havia 51 franceses. Os seis tripulantes eram espanhóis. O avião, um modelo M-83, antigo e ultrapassado, segundo especialistas, estava alugado à Air Algérie. As causas do acidente são atribuídas ao tempo ruim na região e aventa-se até a possibilidade de uma tempestade de areia ter afetado os comandos da aeronave, em decorrência do tempo seco da região.

O terceiro acidente com aviões em uma semana colocou em alerta toda a aviação mundial, até porque o ano não acabou e já pode ser considerado o mais fatal desde 2010, para o setor, quando foram registradas 795 mortes. Este ano, considerando os três últimos acidentes, mais a grande tragédia do desaparecimento do voo MH370, da Malaysia Airlines, em 8 de março, as mortes já chegam a 719.

Não bastassem as tragédias, com perda de vidas humanas, pelo menos duas das maiores se revestem de peculiaridades. O desaparecimento do avião da Malaysia, em março, até agora é um mistério. Pela primeira vez na história da aviação um avião de grande porte (Boeing 777), com passageiros, desaparece sem deixar nenhum vestígio. O outro fato inusitado foi  a tragédia do dia 17 de julho, com o voo MH17, da mesma empresa Malaysia Airlines. Ele entra para rol dos mais raros acontecimentos com avião civil: um avião de passageiros ser  atingido por um míssil a 10 mil metros de altitude.  

Este acidente se reveste de contornos que transcendem uma crise restrita à empresa aérea. Não decorre de condições climáticas ou erro humano, falha de equipamento.  Ele assume contornos políticos, pela forma estúpida e irresponsável com que aconteceu. Há meses rebeldes separatistas russos têm desafiado o poder da Ucrânia, com o beneplácito da Rússia, sem que os líderes mundiais dedicassem mais atenção ao que vinha acontecendo no Leste Europeu. Precisou uma tragédia, com a morte de 298 inocentes, para que dos Estados Unidos à Alemanha, passando por outras potências ocidentais, de repente se dessem conta de que não existem mais crises locais. Todas as crises são globais.

A irresponsável aventura dos separatistas russos, que, ao que tudo indica, abateram o avião por engano, pensando tratar-se de um avião militar da Ucrânia, carregando armas, tornou-se um fato da maior gravidade política. Pela repercussão e os desdobramentos, chega a ser uma ameaça grave à paz na região, já conflagrada. Não esquecer que grandes conflitos começam também por fatos desse tipo, atentados, invasões, que no começo ninguém leva a sério. A Rússia armou e fechou os olhos para o que estava acontecendo na fronteira. E a Europa, mesmo nas suas barbas, fez de conta que a invasão da Crimeia e a ocupação de cidades, na fronteira da Ucrânia, também não era assunto para ela.

Quando acordaram, de um lado temos a Rússia, que agora sofre um forte desgaste econômico e reputacional, respaldado por um líder que adora o culto à personalidade, ao brincar de czar e de anexação de territórios, como se estivéssemos no século XIX. A outra, a União Europeia: não bastassem a crise econômica, questinamentos sobre o futuro do Euro e a pressão dos imigrantes, tenta agora salvar os dedos, já que perdeu os anéis.

Brasil perde três escritores e economia encolhe

Para o Brasil também foi uma péssima semana. Na área cultural, perdemos em poucos dias três escritores de renome. Primeiro foi João Ubaldo Ribeiro, autor do inigualável “Viva o Povo Brasileiro” e de tantas outras obras literárias, crônicas e traduções. O jornalista e escritor, que além de muito popular, conseguiu produzir uma literatura com um fã-clube de milhares de leitores, favorecido por obras transpostas também para o cinema, deixa um vácuo difícil de ser preenchido.

No sábado, 19 de julho, a morte também levou o escritor Rubem Alves, 80 anos, mineiro.  Além de escritor e pedagogo, Rubem Alves era poeta, filósofo, cronista, contador de histórias, ensaísta, teólogo, psicanalista, acadêmico e autor de livros para crianças. É considerado uma das principais referências no pensamento sobre educação e tem uma bibliografia que conta com mais de 160 títulos distribuídos em 12 países. Ele vivia em Campinas.

Na 4ª feira, 23, morreu o escritor e dramaturgo Ariano Suassuna, também ícone da literatura brasileira, principalmente da cultura nacional e do povo do Nordeste. Quando um país perde um escritor, sempre fica mais pobre. Ao perdermos três, em tão curto espaço e tempo, podemos dizer que foi realmente uma semana em que levamos de goleada da “Caetana”, como Suassuna chamava a morte.   

Economia de mal a pior

Não bastasse o baque na área cultural, nos últimos dias, logo depois da decepção no futebol, a economia também é outra crise de que o Brasil não escapa. O cenário cada vez mais pessimista para este ano sinaliza que o país não crescerá nem 1%. Previsões do FMI e do Banco Central acima de 1% são apenas para “brasileiro ver” ou discurso para a mídia, não resistem a uma análise das consultorias e dos bancos. Uns e outros já projetam um ano perdido.

Como diz o editorial da “Folha”, Gestão de erros: “Economistas estimam que o PIB avançará menos de 1% em 2014; os preços dão pouca trégua; a indústria se retrai; a confiança de empresários e consumidores despenca. Não era difícil antever esse cenário, mas só agora a equipe da presidente emite sinais de que ela reconhece equívocos e pretende corrigi-los”... Pena ser tarde demais. O sentimento de atraso contaminou a campanha eleitoral. E não adianta o partido do governo publicar nota de repúdio. Cada vez que a oposição aparece bem nas pesquisas, a Bovespa sobe e as ações das estatais ficam bombando. Seriam os especuladores?

A situação está tão complicada na condução da política econômica atual que, diante do cenário eleitoral, em que fatalmente o debate econômico será o tema principal, o governo está à procura de um bom porta-voz que faça contraponto aos "especialistas" que a oposição certamente botará em campo. Os recuos de decisões tomadas, as previsões que não se confirmam e a falta de uma "cara" com credibilidade na área tem levado a Fazenda a escalar técnicos para debates partidários. Como todos os riscos possíveis. A equipe econômica da reeleição ainda não tem um porta-voz conhecido e com um discurso fechado.

A situação econômica está tão complicada que até os bancos se atrapalham, ao fazer recomendação aos clientes. O Banco Santander enviou comunicado aos clientes "vips" dizendo que o eventual sucesso eleitoral da presidente Dilma Roussef irá piorar a economia do Brasil. O cenário negativo, ao se manter as coisas como estão, foi um ataque de sincericídio do banco espanhol e não merece reparos do ponto de vista do conteúdo. Mas pelo desconforto político, foi rapidamente desmentido pela direção do banco: "A instituição pede desculpas aos seus clientes e acrescenta que estão sendo tomadas as providências para assegurar que nenhum comunicado dê margem a interpretações diversas dessa orientação.”Compreende-se. Neste momento, embora todo mundo saiba que a coisa não está boa, é melhor não abrir o jogo antes da eleição. Vá que... Deve ter sobrado para o mensageiro.

O sentimento nas grandes cidades é de que a Copa foi boa economicamente para poucos grupos: Fifa, hoteleiros, pelo menos nas cidades-sede, alguns patrocinadores. Os taxistas de S. Paulo, Rio e outras grandes cidades dizem que o movimento dos turistas da Copa não compensou a perda com as idas e vindas dos executivos que mantêm o setor aquecido, em tempos normais. Uma única empresa de Congonhas recebeu de volta 33 táxis devolvidos por motoristas que não conseguiram a cota diária de faturamento durante a Copa.

O comércio reclama de redução dos clientes. As indústrias da queda da produção e da produtividade pelas horas paradas nos feriados da Copa. E as escolas atrasaram conteúdo e não irão repor. Até porque ninguém cobra. Os milhões de dólares que os turistas teriam deixado no Rio, em S.Paulo e outras cidades, apregoados por pesquisas, não chegou na ponta. Deve ter engordado os cofres da Fifa, da  Adidas, esta talvez dos patrocinadores que se deu melhor, e da TV Globo. O resto é blá-blá-blá para quem pretende transformar uma versão em fatos. De positivo, talvez, a imagem do Brasil como um país capaz de organizar grandes eventos e a simpatia do povo brasileiro, que os turistas apontaram nas pesquisas. Pelo menos 80% deles dizem que voltariam ao Brasil.

Curto-circuito no setor elétrico

Há uma crise potencial prestes a estourar no país. Não estamos falando, ainda, do abastecimento de água em São Paulo. Essa é nacional. Ninguém escapará. O curto-circuito está no setor elétrico. Se já vinha com problemas, a partir do ano passado a coisa piorou. E não por culpa de São Pedro, como os governantes costumam atribuir. Por incompetência. O setor está endividado. A presidente tentou fazer uma bondade eleitoral, quando anunciou, em janeiro de 2013, que as tarifas elétricas iriam baixar em média 18% para residências e 32% para indústrias..

Não demorou muito, em cadeia, o setor se desestruturou e acabou endividado. “O erro desorganizou o setor e deixou a Eletrobrás em situação falimentar. A conta, que já chega a dezenas de bilhões de reais, um dia será repassado aos consumidores”, diz editorial da “Folha”. 

Geradoras foram socorridas pelo BNDES com bilhões de reais e agora a salvação cai no colo do Banco do Brasil e da Caixa. Eles terão que dar empréstimos também de bilhões para corrigir distorções num setor em que há ministro que pouco entende, e pensa que entende; e uma presidente que veio da área, pensava-se que entendia, mas agora se vê que também não sabia tanto. A única notícia positiva dos últimos sete dias é que daqui a algumas horas a semana vai acabar.

Comunicado do Santander, enviado aos clientes especiais

 santander comunicado aos clientes

 

 

 

 

 

 

 

 

Íntegra da nota do Santander, após a divulgação da carta:

“O Santander esclarece que adota critérios exclusivamente técnicos em todas as análises econômicas, que ficam restritas à discussão de variáveis que possam afetar os investimentos dos correntistas, sem qualquer viés político ou partidário. O texto veiculado na coluna ‘Você e Seu Dinheiro’, no extrato mensal enviado aos clientes do segmento Select, pode permitir interpretações que não são aderentes a essa diretriz. A instituição pede desculpas aos seus clientes e acrescenta que estão sendo tomadas as providências para assegurar que nenhum comunicado dê margem a interpretações diversas dessa orientação.”

Fotos: Mohammed Abed.

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