bea_conferenceMais um capítulo na crise da Air France, decorrente da queda do Airbus, em junho de 2009, no litoral brasileiro. Na ocasião, morreram 228 pessoas. O Escritório de Investigações e Análise para Aviação Civil (BEA, na sigla em francês) divulgou nesta sexta-feira, 29, um dos mais completos relatórios (o terceiro) sobre as causas do acidente com o voo AF 447.

As principais conclusões confirmam a falha nos sensores de velocidade da aeronave e a interpretação incorreta dos dados pelos dois copilotos, o que levou à condução errada do avião. Na hora em que a aeronave começou a ter problemas, o piloto estava descansando. Ou seja, uma combinação de ações equivocadas da tripulação, mau funcionamento dos equipamentos e mau tempo parece ter selado a sorte do AF 447. O voo durou 2 horas e 14 minutos.

O BEA diz, porém, que até o momento é impossível confirmar erro dos pilotos, embora isso esteja implícito nas conclusões apresentadas no relatório. Existe a suspeita, mas não está provada a culpa. Foram divulgados os diálogos dos pilotos e o desespero da tripulação para encontrar uma solução para os problemas que os instrumentos apontavam. O “acidente poderia ser evitado”, admite diretor do BEA. Eles não informam se os passageiros foram avisados das dificuldades.

"Nós estamos ainda tentando interpretar estas informações para ter um melhor entendimento do que aconteceu", disse Jean-Paul Troadec, diretor do BEA, na França. "Este trabalho apenas começou". Um relatório mais completo será divulgado pelo fim de julho, disse Troadec. A pergunta é, por que não fazer essa divulgação quando o BEA tivesse informações mais conclusivas?

O mais grave do relatório divulgado é que as falhas de pilotagem, segundo o BEA, podem ser atribuídas à falta de treinamento para situação de risco a qual os pilotos estavam submetidos. Com isso, a agência fez novas recomendações sobre treinamento de tripulação, assim como de novas maneiras de registro do que ocorre dentro das aeronaves. As conclusões ajudam também a acirrar a briga entre Air France e Airbus.

Investigadores independentes, segundo o New York Times, confirmaram que era o copiloto Pierr-Cédric Bonin, 32 anos, que estava no comando do Airbus no momento em que o avião começou a ter dificuldades. Dos três membros da tripulação,  era o que registrava menos horas de voo. Ele tinha cerca de 3 mil horas de experiência, enquanto o primeiro copiloto, David Robert, 37 anos, tinha 4.500 horas e o Comandante da Aeronave, Cap. Marc Dubois, 58 anos, era um veterano piloto, com mais de 11 mil horas de voo e uma grande experiência em Airbus A330 e A340. O nome da tripulação não foi divulgado no relatório do BEA. 

A Air France apressou-se em divulgar uma nota em que repudia as informações do BEA. O comunicado afirma “que durante essa sequência de acontecimentos, a tripulação no comando, reunindo as competências dos dois copilotos e do comandante, fez prova de consciência profissional e comprometimento até o fim na condução do voo”. Ela não aceita colocar em dúvida a competência técnica dos pilotos.

A empresa francesa há dois anos enfrenta a via crúcis de toda a empresa aérea que sofre acidente de proporções, como aconteceu com a Air France. O trânsito brasileiro mata por dia em média 110 pessoas. O equivalente a um avião comercial de porte médio. Entretanto, os acidentes aéreos, principalmente de voos internacionais, têm esse estigma de repercutirem com muita intensidade, quando geralmente o número de vítimas é bastante elevado e por envolver passageiros de várias nacionalidades.

Logo após o acidente, em 2009, a gestão da crise conduzida pela Air France foi bastante satisfatória. A empresa foi rápida na montagem de uma estrutura para atendimento aos parentes das vítimas, tanto em Paris, quanto no Rio de Janeiro. Além disso, em trabalho conjunto com a Aeronáutica e a Marinha do Brasil, a Air France prestou todas as informações sobre os trabalhos de resgate. A forma como a Air France conduziu essa crise, nos primeiros momentos, foi analisada em artigo neste site, em 2009:  "O Gerenciamento da  crise do Air France 447".

Depois dos primeiros relatórios, ainda inconclusivos, em 2009, a empresa atravessou um período complicado, diante da pressão dos familiares, por não ter explicações convincentes sobre o acidente, uma vez que o avião e os principais equipamentos de informações do voo tinham desaparecido no mar. Enquanto a caixa-preta não foi encontrada, pelo menos durante quase dois anos só foram feitas conjecturas. Agravou-se essa relação entre empresa e parentes das vítimas pela impossibilidade também de resgatar a maioria dos corpos. Só 50 foram resgatados logo após o acidente.

Isso dificultou a investigação e as relações com os parentes dos passageiros, por conta de indenizações e, principalmente da indefinição da culpa, ora atribuída à fabricante do avião, a empresa francesa Airbus, ora à empresa aérea.

Mais de um ano depois do acidente, em 2010, diante das tentativas frustradas de achar o avião e os equipamentos de controle, a Air France resolveu investir em instrumentos mais sofisticados. Obteve sucesso, no início deste ano, com o uso de um robô submarino que localizou a aeronave, com a maioria dos corpos dos passageiros, além da caixa-preta e outros equipamentos importantes para a investigação a 4.500 metros de profundidade.

A Air France também surpreendeu ao resgatar mais 104 corpos de passageiros, uma tarefa inédita até então, sobretudo pela profundidade onde a aeronave foi encontrada e pelo tempo decorrido do acidente. Isso possibilitou melhorar a imagem da empresa, pelo esforço em buscar os aparelhos de bordo que explicassem as causas do acidente. Agora, diante das revelações do BEA, um novo capítulo começa nesse processo que completou dois anos. Haverá polemização em torno das conclusões do BEA, até porque as famílias não aceitaram essa conclusão de maneira pacífica. É uma crise que não terminará tão cedo. O passivo de imagem que a Air France carrega ainda vai durar muito tempo.

Resumo das causas do acidente

Relatório oficial dos investigadores franceses aponta as três causas principais da queda do avião da Air France:

  1. Falha no gerenciamento da cabine: O comandante de bordo saiu da cabine para descansar sem dar ordens claras aos copilotos. Ao retornar para o local, durante a queda, não retomou o controle. Os pilotos tentaram, ao mesmo tempo, dar comandos ao avião sem adotar procedimentos esperados, como fazer a checagem de informações antes de tomar uma decisão.
  2. Perda de sustentação: O alarme de estol (que indica perda de sustentação) não foi percebido pelos pilotos. Em nenhum momento eles falaram em voz alta, como era esperado, que o alarme soava – apesar de ele ter tocado por 54 segundos sem parar. Ao contrário do que se espera para a retomada da sustentação, eles elevaram o nariz da aeronave”.
  3. Treinamento – Os pilotos não foram treinados para entender o que ocorria com o avião depois de congelamento dos pitots (sensores de velocidade) e da perda das informações sobre o ocorrido. Nessa situação e com o piloto automático desligado, eles também não sabiam controlar manualmente a aeronave.

Fonte: Correio Braziliense/Relatório DEA

Nota da Air France, sobre o relatório do BEA

Reação da Air France à publicação do terceiro relatório do BEA

O Bureau de Pesquisas e Análises acaba de apresentar, em seu terceiro relatório, as circunstâncias exatas do acidente do voo AF 447 Rio/Paris em 1º de junho de 2009.

Este trabalho vem esclarecer ainda mais esta tragédia que abalou profundamente a Air France e a comunidade do transporte aéreo. A empresa deseja prestar sua homenagem à memória dos passageiros e membros da tripulação deste acidente e transmite seus sinceros pêsames às suas famílias.

A partir da análise dos dados dos gravadores de voo, ficou presentemente estabelecido que a combinação de múltiplos elementos improváveis conduziram à catástrofe em menos de quatro minutos: o congelamento das sondas Pitot foi o evento inicial que levou ao desligamento do piloto automático, à perda das proteções associadas de controle de pilotagem e a consideráveis movimentos de rolagem. Num ambiente dentro da cabine de comando degradado e desestabilizado, o aparelho perdeu sustentabilidade a grande altitude, sem conseguir recuperá-la, e chocou-se na superfície do oceano Atlântico em grande velocidade. Note-se que as inúmeras vezes em que os alarmes de perda de sustentabilidade foram ativados e parados intempestiva e enganosamente, em contradição com a situação do avião, contribuiu fortemente na dificuldade da tripulação em analisar a situação.

Durante esta sequência de acontecimentos, a tripulação no comando, reunindo as competências dos dois copilotos e do comandante, fez prova de consciência profissional e comprometimento até o fim na condução do voo. A Air France presta homenagem à sua coragem e à sua determinação nestas condições extremas.

Nada permite, neste estágio, colocar em dúvida as competências técnicas da tripulação.

O trabalho agora vai continuar a fim de compreender as causas, os diferentes fatores técnicos e os fatores humanos que contribuíram no desenrolar desta catástrofe. É importante compreender se o ambiente técnico, os sistemas, os alarmes complicaram a compreensão da situação por parte da tripulação.

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