As redes sociais se tornaram uma avenida de oportunidades para as empresas, mas podem ser também uma séria ameaça de crise, por "posts" precipitados ou equivocadas de diretores, sócios ou funcionários. Mesmo que a empresa ou órgão público não sejam explicitamente citados, o simples fato de o executivo ou empregado ser vinculado ao quadro da organização, pode representar uma ameaça à reputação ou à marca, se o conteúdo do "post" for negativo. Por isso, algumas dicas dos especialistas em PR são importantes para saber como lidar e evitar crises, pela exposição desnecessária nas redes sociais.
Em artigo publicado em junho último, no site PRNEWS, de autoria de Sophie Maerowitz, - As publicações nas redes sociais dos funcionários ainda são um problema de relações públicas a resolver? - esse tema foi levantado e parece ser um assunto, mesmo nos EUA, ainda não pacificado. Não é raro grandes organizações terem problemas sérios de reputação, decorrentes de exposição errada nas redes.
“Pode parecer que as conversas nas redes sociais não poderiam ficar mais polarizadas. Mas, em face de uma economia pandêmica e em queda livre, há alguns meses das eleições (nos EUA), as marcas continuam a se encontrar no meio de questões polêmicas, forçadas a escolher lados em tópicos anteriormente considerados fora do escopo de gestão da empresa.”
Para a autora, “a situação fica ainda mais delicada quando um funcionário faz uma declaração ousada ou é identificado na mídia online de uma forma que se afasta da linha da empresa.” Em 2017, Juli Briskman (que agora é uma autoridade eleita na Virgínia) foi demitida do emprego, como contratada do governo, depois de ser reconhecida em uma foto viral dando aos apoiadores de Trump o dedo médio. Ou seja, ações ou gestos inconsequentes, feitos anos antes, podem ser ressuscitados repentinamente por adversários políticos ou inimigos públicos, concorrentes, sem que a empresa possa evitar. Quando se dá conta, a crise já desembarcou dentro da sala da diretoria.
Mesmo no Brasil, no governo Bolsonaro, já houve caso de demissão ou “queimação” de candidato a cargo por causa de fotos ou posts vinculados a inimigos políticos do atual clã que ocupa o Palácio do Planalto.
Fora da política, não são raros esses fatos: o executivo que formulou ou escreveu uma declaração imprópria, até o empregado que eventualmente faz algum comentário precipitado, racista, religioso, xenófobo, atacando o cargo ou a empresa, e acaba gerando um problema de imagem constrangedor. As redes sociais não são um território livre e reservado. Ele é público e qualquer pessoa, post, curtida, comentário passa a ser público, não importa o perfil ou a plataforma onde foi publicado. Ressalte-se que o argumento, válido tanto para a mídia tradicional, quanto para as redes sociais, de que a autoridade ou o empregado falou em nome particular, não em nome da empresa, também não tem qualquer sustentação. Quando um ministro, um executivo da empresa ou membro de um dos órgãos do Estado posta alguma coisa nas redes sociais, o CNPJ da organização também vem junto.
À medida que surge a possibilidade de funcionários irresponsáveis ou desonestos aparecerem nas redes sociais, e comprometerem a organização, os comunicadores devem recorrer a recursos legais, bem como se blindar na política de comunicação e na estratégia interna da empresa para se preparar para responder.
Conheça os riscos
Como algumas multinacionais atuam, neste caso? Gene Grabowski, diretor da empresa de PR e Public Affairs kglobal, nos EUA, adota uma abordagem cautelosa, pedindo aos funcionários e membros do conselho que evitem parecer "excessivamente partidários ou comprometidos com causas ou pontos de vista específicos" nas redes sociais. É óbvio que a empresa não quer perder negócios ou ser banida das licitações, apenas por ações inconsequentes de ex-empregados ou mesmo pessoas comuns.
“Um número crescente de consumidores mais jovens evita fazer negócios com pessoas cujos pontos de vista diferem dos deles”, diz Grabowski. Ele observou quedas acentuadas nas vendas de organizações depois que funcionários ou contratados postaram declarações ou fotos "que pareciam racistas, sexistas ou insensíveis a um determinado grupo". Além disso, em alguns países, incluindo o Brasil, a empresa que envereda por esse caminho corre alto risco de ser multada e processada.
Grabowski argumenta que os funcionários que falam sobre questões sociopolíticas "arriscam fazer a empresa para a qual trabalham um alvo de consumidores ou grupos ativistas" que se mobilizam em grande número nas redes sociais em questão de horas. Esse problema é ampliado quando grupos de ativistas online alcançam repercussão entre jornalistas e órgãos de imprensa.
Deixe isso para os especialistas legais
Embora possa parecer contra-intuitivo para os profissionais de RP prontos para a crise, às vezes é melhor simplesmente ignorar, depois de um funcionário postar sobre um assunto controverso. Ashley Sasnett, estrategista digital da Equifax, diz que, na maioria das vezes, os próximos passos devem ser determinados "pelos departamentos jurídico, de RH e de risco". Mas, convém lembrar, o Jurídico, e nenhuma outra área da empresa, pode atrasar o posicionamento, uma vez definida a linha de ação.
Para Maerowitz, “as empresas devem determinar primeiro se o problema é um risco legal ou de reputação antes de tomar medidas para solucioná-lo.” Isso deveria ser feito, alinhado com o Comitê de Crise. E, especialmente se for o primeiro, comunicadores de mídia social deveriam estar bem equipados para limitar seu envolvimento, argumenta Sasnett. "Pedir à equipe de mídia social, [que] geralmente trabalha em marketing, comunicação ou atendimento ao cliente, para escrever a política é como pedir a Keith Richards, que é um guitarrista incrível, para dançar como Misty Copeland, que é uma bailarina incrível."
Seja simples e direto
Para Dwayna Haley, vice-presidente sênior e diretora de inovação de marca da Porter Novelli, as melhores políticas corporativas de mídia social são simples e diretas. “É muito importante que os funcionários entendam que há tolerância zero para o discurso de ódio”, ela argumenta. As políticas devem definir a natureza exata do discurso de ódio e não ter medo de "dar exemplos para maior clareza".
Viva e deixe Viver
Mas, até que ponto os empregados têm liberdade par usar a rede social? Afinal, a maioria não quer sequer mencionar a empresa, quando entra nas redes. Para Dwayna Haley, “exceto pelo discurso de ódio, os funcionários devem ter autonomia para serem eles mesmos online, diz. No clima carregado de hoje, não há razão para que, ao postar ou repostar pensamentos sobre justiça social, igualdade racial ou direitos humanos, isso sirva como uma acusação ao empregador. Ela informa que as empresas exigem que os funcionários adicionem uma nota "as opiniões postadas aqui são minhas" em suas biografias de mídia social - e depois sigam em frente.
"Já passamos muito da época em que a mídia social era nova e as empresas sentiam a necessidade de controlar o discurso público por medo de rebatidas", disse Haley, acrescentando: "Todos agitam sua bandeira de aberrações online. Deve caber a cada funcionário gerenciar seu envolvimento online de forma responsável, assim como fariam em qualquer troca respeitosa. "
Uma lista de verificação da política de mídia social*
No Brasil, várias empresas já usam o Manual de Redação das Redes Sociais. Até porque, com o passar do tempo, os usuários vão se atribuindo uma liberdade para escrever, contestar, acusar, que nenhum jornalista tinha no fim do século passado.
“Enquanto Grabowski, como Sasnett, aconselham os comunicadores a aproveitarem a assessoria jurídica à medida que resolvem os detalhes, ele oferece as melhores práticas para comunicadores que desejam elaborar uma política de mídia social:”
- Exponha claramente no manual do funcionário a política da empresa em relação aos materiais publicados dos funcionários, especialmente postagens nas redes sociais;
- Embora você não possa limitar legalmente o que alguém diz online, você pode especificar atividades que são causa de indisciplina, podendo gerar penalidades e até a demissão como uma condição de emprego;
- Discutir a mídia social da empresa e a política de materiais publicados com todos os funcionários quando eles estiverem dispostos ou na admissão;
- Publique nas mídias sociais dos funcionários da empresa a política de comportamento nas redes sociais; (site da empresa, comunicados, redes sociais);
- Como parte do plano de crise da empresa, prepare declarações básicas que podem ser facilmente modificadas e usadas no caso de um funcionário violar a mídia social e a política de materiais publicados.
- Não esquecer que as redes sociais são públicas e que, qualquer publicação que a empresa julgue impertinente ou prejudicial aos seus negócios ou tenham um viés contrário aos valores da empresa, pode ser considerada falta grave.
* Sugestão da autora do artigo, com adaptações.