shoppingUm quarto das famílias brasileiras, o que significa um universo de 14 milhões, está endividada, tendo comprometido um terço da renda mensal.  A facilidade propiciada pelo sistema bancário, com incentivo do governo, para abrir as torneiras do crédito, fez uma massa de brasileiros correrem aos bancos e às lojas em busca de empréstimos ou de compras a prazo. Resultado: a inadimplência chegou a níveis preocupantes. E os bancos recuaram.

Boa parte do endividamento, principalmente das classes B e C, decorre da compra de automóveis. O governo ainda dá mais força com a política de redução do IPI, uma decisão econômica muito controvertida. Incentivar a compra de automóveis tem um efeito deletério sobre as políticas de mobilidade urbana e se choca frontalmente contra políticas do próprio governo federal de incentivar o transporte de massa. 

Colocar mais carros nas ruas é um contrassenso, principalmente em capitais, onde trânsito congestionado, falta de estacionamentos e precariedade do transporte de massa demonstram o equívoco do incentivo do governo. Além disso, mais carros na rua significa mais poluição, consumo de combustível e acidentes. Um efeito em cascata com enorme peso nas contas públicas.

Se, de um lado, os brasileiros se endividam, na outra ponta do crédito, os bancos comemoram. A expansão do crédito, junto com uma política de cobrança de tarifas, proporcionaram aos 25 maiores bancos brasileiros lucro líquido de R$ 50 bilhões em 2011. Para se ter uma idéia do que representou nos últimos anos, o volume de crédito no Brasil, há quatro anos representava 37% do PIB. No fim do ano passado, subiu para quase 50%.

Por si só, esse indicador não chega a ser um problema. Em países com economia sólida e melhor distribuição de renda, aumentar o crédito é bom para a economia. Nos países desenvolvidos, como EUA,  o volume de crédito representa 180% do PIB. Na Europa chega a 160%. 

No caso do Brasil, torna-se um problema, quando o endividamento supera 30% da renda familiar e a sobrevivência acaba comprometida. Além disso, essa faixa da população não faz jus ao Bolsa Família. Com isso, retiram os filhos da escola, para ajudar no complemento da renda, expondo esses jovens a uma situação de frustração quanto às expectativas de ascender na pirâmide social e se preparar melhor para o mercado de trabalho.

Pode ser paradoxal, mas essa situação se tornou agora mais grave, porque, com taxas de juros mais baixas,  houve uma pressão creditícia para cima dos bancos. Banco não empresta porque quer fazer caridade. Quer ganhar. Assustados com a elevação nos índices de inadimplência,  os bancos apertaram os critérios de concessão de crédito, por uma questão de sobrevivência, no dizer de Nicolas Tingás, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito. Quem se endividou, ficou na mão.

O apelo pelo consumo, as seduções de um mercado cada vez mais aquecido e a própria pressão da sociedade acabam levando uma faixa da população, com pouca educação financeira, e sem garantias, a comprar o que não pode. No primeiro aperto, os devedores preferem atrasar o pagamento de supérfluos e garantir a sobrevivência ou a moradia.

A compra do carro, com as consequentes  despesas associadas (prestação, documentos, seguro, manutenção) é a principal causa do endividamento da classe C.  Isso representa 27,6% das compras dessa faixa de renda.  Segundo declarou ao jornal O Estado de S. Paulo, Marcel Solimeo, da Associação Comercial de S.Paulo, a alta inadimplência de veículos reflete a farra do crédito proporcionada pelas ofertas das montadoras e os incentivos do governo. Agora, os devedores preferem entregar o carro do que contrair novos empréstimos. Perdem o carro e as prestações pagas.

Mas a inadimplência não atinge apenas as classes C, D e E. Executivos do setor de shopping centers também registraram que o repique na inadimplência dos empreendimentos, nos primeiros três meses do ano, também se estendeu a abril. O índice recorde para o período foi o maior nos últimos 11 trimestres. São empresas que juntas administram 61 shopping centers no país. Esse calote incluiria todos os tipos de perfis de clientes que frequentam os shopping.

Até onde o governo pretende levar essa política? Ninguém sabe. A retração na economia, detectada em vários indicadores industriais (com destaque para a galinha dos ovos de ouro da economia, o agronegócio), parece assustar o governo que até agora nadou de braçada nos bons indicadores do Brasil, se comparados aos países mergulhados na crise econômica desde 2008.

Entretanto, com o calote elevado,  o país colhe a festa prematura do ministro da Fazenda, quando sinalizou aos bancos públicos que abrissem as torneiras. Empolgado com os números da economia há alguns meses, o ministro da fazenda atropelou até a lógica do mercado econômico, chegando a afirmar, há uma semana, que estamos em melhor situação do que os Estados Unidos porque temos uma taxa de juros elevada, com tendência de queda.

Eles, segundo o ministro, por praticarem taxas reduzidas de juros, não tinham onde cortar para resolver a crise. Enquanto nós, mais espertos, poderíamos cortar muita gordura de nossa elevada taxa de juros. Por isso, melhores preparados para a crise.  Seria mais ou menos como cumprimentar os gordinhos, pela posição privilegiada em relação aos magros, por terem alguns quilos a mais para cortar. Com um timoneiro que dá opiniões como essa, não é de admirar que a bolha da inadimplência tenha crescido. (João José Forni)

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