Crise_no_senado_OKO Congresso Nacional virou a bola da vez da imprensa. Não porque a mídia tenha escolhido aleatoriamente atacá-lo. Desde março, o festival de desmandos no Senado e na Câmara dos Deputados consegue tornar um dia pior do que o outro. A imprensa tem obrigação de cobrir. Começou com denúncias sobre a verba indenizatória, vieram as passagens, os diretores de faz-de-conta e todos os dias uma denúncia nova contra o erário.  

A crise do Congresso não se resolve com discurso, nem com história. Nem existe complô da imprensa para desmoralizar o Congresso, como disse “o cara”. Ou “vítimas de uma campanha midiática”, nas palavras de outro. Aliás, do jeito que vai, o Congresso não precisa de campanha para macular sua reputação. O descaramento com que um grupo se apossou da folha de pagamento do Senado é um escândalo maior do que o mensalão, segundo Jânio de Freitas. Como é possível um diretor-geral do Senado, há 14 anos, fazer gatos e sapatos, e nenhum Senador ou assessor se dar conta disso. Quantos secretários-gerais passaram pelo Senado durante esses anos todos? Deveriam ser indiciados, porque afinal, a eles cabia fiscalizar o orçamento do Congresso e os desmandos dos subalternos.  

Imaginem uma empresa, com milhares de funcionários e diretores que contratam e fazem licitações sem o comando da organização saber? Isso não existe. Mas no Congresso aconteceu.  Quando se vê agora na televisão rostos constritos de Senadores, fazendo discursos inflamados contra as falcatruas, abismados pelo que está acontecendo, é bom perguntar onde eles estavam quando Agaciel e seu bando tomaram conta da Casa? Quantos se beneficiaram ou facilitaram a vida de parentes, amigos e apaniguados com os “atos secretos” de Agaciel?

As fases da crise

O Congresso parece ter seguido um roteiro básico quando o incêndio começa numa organização que não sabe como lidar com a crise. No início, os dirigentes tentam negar a própria crise. Foi o que aconteceu. Sarney e outros senadores da base aliada, junto com o presidente da República, fingiram ignorar o que estava acontecendo.  

Diante das evidências, o segundo passo é tentar minimizar a crise. De denúncia em denúncia, quando se deram conta o Senado e a Câmara foram aos poucos arrastados para o redemoinho da crise, caracterizando a primeira fase de uma crise grave. O problema é que essa etapa paralisa a organização, despende-se muita energia para tentar, primeiro fugir da crise, e depois contorná-la.  

Desde que as denúncias começaram, o Senado e a Câmara, se já não são exemplos de produtividade, acabaram literalmente parados. O Parlamento brasileiro não está nas manchetes pelo que nós contribuintes o pagamos para fazer. Mas pelos desvios de conduta. E nós continuamos arcando com essa conta. Suas excelências, por não terem trabalhado nas últimas semanas, deveriam cortar o recesso de julho e deixar o forró para outra ocasião. Mas adivinhem onde estavam nos últimos dias de junho? Com as passagens pagas por nós.   

A atitude de negação da crise pode ser exemplificada nos discursos do presidente do Senado, nas evasivas dos diretores afastados, mas não demitidos, na surpresa de suas excelências, que nada sabiam. A fase seguinte é do reconhecimento da crise. Existe uma crise, então vamos tentar debelá-la. Demorou, mas agora o Congresso parece se dar conta de que precisa resolver o imbróglio em que se meteu. O pior de tudo é que em lugar de os Senadores e deputados se empenharem em resolver a crise, eles se digladiam em duas forças. Uma quer  resolvê-la com medidas drásticas, mas quer tirar dividendos políticos e obter visibilidade. Outra emperra, tenta se agarrar ao discurso do golpismo (como virou moda falar nisso, quando os culpados querem se safar), procura obstruir qualquer ação mais rigorosa para apurar o que houve e punir os culpados. É a turma dos panos quentes.

Segundo a receita de crise do guru Jack Welch, as organizações devem se dar conta de que numa crise grave haverá mudanças nos processos e nas pessoas. E que, em geral, nenhuma crise termina sem sangue no chão. O Senado não consegue atravessar essa fase. A cada denúncia, só se ouvem desculpas e paliativos. Nenhum ato decisivo, que realmente implique mudanças. As pessoas são intocáveis. Aquele batalhão de diretores denunciados há dois meses, continua lá, como diretores de check-in, de garagem e outros penduricalhos. Mais de 60 diretores nomeados por Agaciel continuam intocáveis.  

Ex-diretores continuam circulando pelo Senado como se nada tivesse acontecido. Fala-se agora em licença remunerada de 90 dias para Agaciel Maia se defender. Ah, quer dizer que ele se mete em falcatruas e nós temos que pagar para ele ficar em casa preparando sua defesa! É realmente incrível esse estatuto do servidor público. O que mais rolou nesse compadrio entre políticos e marajás, que a gente ainda não sabe?

Mas qual seria a atitude correta de suas excelências? No meio da turbulência, vez ou outra aparece uma opinião lúcida, como a do Senador Pedro Simon, que recomendou ao presidente do Senado se afastar. É o mínimo, quando na organização um dirigente se vê envolvido em denúncias que comprometem no mínimo sua família, como acontece com o Senador José Sarney. Recuar não significa uma confissão de culpa. Apenas facilitar a apuração. Para qualquer lado que se olhe, aparece citado alguém de sua família com algum benefício.

E mais: não existe solução de crise, sem um líder. É preciso definir quem está liderando as ações para debelar a crise do Congresso. É muito difícil achar uma solução, quando as lideranças estão comprometidas com atos desabonadores, que, na essência, são exatamente os alimentadores da crise.

Uma receita de gestão de crise para o Congresso

Na falta de um plano sério de gerenciamento de crise e de disposição para tocar o dedo na ferida, vai aqui uma contribuição espontânea, como sugestão para ajudar a resolver a crise do Senado. Apenas para minimizar, porque nesse tipo de crise não há como a imagem sair preservada. O estrago já está feito.

* Criar um Comitê de Crise, sob a liderança de parlamentar de vida ilibada, aceito pelas lideranças do Congresso e acima de interesses partidários, com força para adotar e prazo para apresentar soluções;
* Fazer uma rigorosa auditoria externa nas contas do Congresso, com prazo curto para apresentar publicamente os resultados, não mais de 15 ou 30 dias. Não valem auditorias realizadas por órgãos internos ou funcionários do próprio Congresso;
* Fazer auditoria na folha de pagamento do Senado e da Câmara, realizando uma “limpeza” em funcionários fantasmas, indicados por políticos, terceirizados e outros aspones que não comparecem ao trabalho ou fazem de conta que trabalham;
* Chamar Ministério Público Federal, Polícia Federal e Tribunal de Contas da União para fazer apurações paralelas, de modo a complementar o trabalho das auditorias externas;
* Afastamento compulsório de servidores ou parentes de parlamentares ou funcionários citados em qualquer denúncia, para que haja isenção total na apuração. Não é possível manter em cargo de chefia no Congresso quem está sob suspeição ou foi beneficiado por alguma medida;
* Demissão sumária de todo o servidor público que, de alguma forma, foi responsável por atos secretos ou que foi nomeado pelos mesmos atos;
* Anunciar a divulgação de todas as despesas do Congresso, inclusive salários de todos os servidores, na internet. Inclui não só o salário nominal, mas todas as vantagens extras, comissões, etc. Só assim pode-se descobrir quantos Agaciéis ganham cerca de R$ 40 mil por mês;
* Exigir de todos os parlamentares que utilizaram funcionários públicos para qualquer tipo de trabalho particular (empregados domésticos, mordomos, motoristas, porteiros, seguranças, assessores eleitorais, etc.) que devolvam os valores pagos no período em que esses empregados estiveram à disposição desses parlamentares;
* Solicitar a abertura de inquérito contra todas as pessoas que durante os últimos anos, incluindo outras legislaturas, se valeram do Congresso para enriquecimento ilícito ou contratações irregulares. Isso inclui não só servidores, como parlamentares ou ex-parlamentares;
* Determinar a devolução de todos os apartamentos funcionais utilizados irregularmente por ex-parlamentares, parentes ou amigos de ex-parlamentares, imputando a eles ou à família as despesas pagas desde o dia em que deixaram o Congresso;
* Determinar a devolução de valores gastos com passagens da cota do Congresso, em viagens de parentes, amigos ou pagamento de jatinhos particulares. A devolução deverá ser feita com desconto no salário;
* Instituir o ponto eletrônico para todos os servidores. Quem não comparecer ao trabalho ou chegar atrasado, terá os descontos correspondentes na folha de pagamento, como fazem todas as instituições sérias;
* Apresentar todos os resultados dessas auditorias em sessão pública do Congresso, sem qualquer interferência política, em acordo suprapartidário;
* Construir uma agenda para o segundo semestre de 2009, com objetivos bem definidos, para tentar reverter a exposição negativa do primeiro semestre e dar um mínimo de credibilidade ao Congresso Nacional.

Se pelo menos parte das sugestões não forem adotadas, dificilmente o Congresso Nacional sai do atoleiro em que se meteu. Vamos acabar engolindo medidas paliativas, midiáticas, que servem mais para preservar privilégios, iludir e ganhar tempo, enquanto as eleições não chegam. Como aconteceu em outras crises.

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